Por que Paris se tornou
o alvo do Daich/ISIS?
18 de novembro
de 2015 – O jornalista Barry Lando explica (em entrevista para Jessica
Desvarieux – NT) como e porque os ataques franceses contra o Estado Islâmico,
sua atuação militar na África e sua relação tempestuosa com a sua população
interna de muçulmanos deu origem a um ataque em Paris.
JESSICA DESVARIEUX,
PRODUTORA, TRNN; bem vindos à REAL NEW NETWORK. Eu sou Jessica Desvarieux, em
Baltimore.
As autoridades em
Paris perseveram na caçada humana aos suspeitos de estarem envolvidos nos
devastadores ataques de sexta feira. O jornal The New York Times relata que dois deles morreram em uma busca a um
dos maiores suspeitos, a qual resultou em uma mulher que explodiu a si mesma.
Enquanto isso, muitos, entre os quais se inclui o presidente francês François
Hollande, solicitaram uma extensão do Estado de Emergência que está em vigor na
França.
Para dar as últimas
notícias de Paris quem se junta agora a nós é Barry Lando. Barry é o autor do
livro “The Watchman’s file” e também um antigo produtor do Show “60 minutes” da
CBS. Muito obrigada por se juntar a nós, Barry.
LANDO: Obrigado.
DESVARIEUX: Muito bem,
Barry, fale sobre as notícias mais recentes. Nós sabemos que ainda há muitas
questões sem resposta. Mas você pode nos
falar sobre o que já se sabe sobre o ataque? Posso imaginar que os franceses
devem estar agora refletindo sobre o sentido disso tudo. O que o povo francês
pergunta a si mesmo? Eles estão se perguntando por que a França?
LANDO: Claro que
se perguntam porque a França. A princípio, eu penso que muitos deles estavam se
perguntando isso, mas não por muito tempo. É claro que eu também pensaria como
a maioria. Por que a França? Assim de estalo poderia responder que é a França
porque a França tem liderado os ataques militares contra o Daich/ISIS na Síria,
e a França também esteve muito ativa ultimamente no norte africano, no Magreb,
lutando naquela parte do mundo contra radicais islâmicos ao longo dos dois
últimos anos, pelo menos. Então, não dá para negar que a França tem um
histórico militar. Além de uma relação conflituosa com o mundo islâmico, a
França tem sido muito agressiva contra os muçulmanos, eu diria que perdendo
apenas para os Estados Unidos, tanto em quantidade quanto em qualidade de
agressividade. As tensões entre a França e a população muçulmana dentro do próprio
país, cresceu nos últimos anos. Como resultado dessa agressividade, muitos
jovens de origem muçulmana foram atraídos para a esfera do Daich/ISIS e foram
para a Síria e para o norte da África para lutar contra a França por lá, ou
para se tornar parte da nova “pátria” muçulmana autodeclarada na Síria e no
Iraque.
DESVARIEUX: Certo.
Fale rapidamente sobre o que está acontecendo neste momento na França relação à
oposição entre a segurança e as liberdades civis. Que tipo de políticas estão
sendo propostas?
LANDO: Bem,
as políticas propostas são muito parecidas com as que surgiram nos Estados
Unidos na sequência dos acontecimentos de 9/11. Claro que há algumas pessoas
que se lembram dos direitos civis e pedem para que não se vá com tanta sede ao
pote. Mas não se pode esquecer que ao mesmo tempo, estão vivendo o dia seguinte
de um dos mais chocantes ataques, talvez
o mais chocante deles, desde que se leve em conta que a França jamais foi
atacada em seu próprio solo desde a Segunda Guerra Mundial. Então, é muito
difícil argumentar neste momento que a polícia não deveria ser tão dura, que as
leis não deveriam se tornar mais duras, que eles não deveriam invadir casas sem
mandado etc. Que não poderiam prender suspeitos, mantendo-os na prisão por dias
sem questionar, sem que haja qualquer procedimento de habeas corpus. É normal
essa dificuldade, e nem está sendo questionada. Por causa de muitas dessas
coisas, o presidente Hollande está neste momento sendo questionado porque não
foi mais duro antes, e mesmo agora, porque não está sendo ainda mais severo.
Colocando de forma diferente, existem centenas, senão milhares de jovens que tiveram
treinamento ou mesmo já lutaram pelo Daich/ISIS que retornaram para suas casas
na França. Há anos que isso acontece, e as pessoas de direita estão sempre
clamando para que eles sejam presos, detidos imediatamente ao retornar, e que
permaneçam na cadeia. Não foram. Caso isso realmente fosse colocado em prática,
seria um fardo enorme para os sistemas de segurança e vigilância da França, porque
há muitos deles. Devem ser contados aos
milhares.
DESVARIEUX: Mas
Barry, imagino que não haja muitas vozes falando sobre os direitos civis neste
instante. Quer dizer, se você fala sobre a suspensão de habeas corpus, sobre
batidas policiais sem qualquer mandado, onde é que será colocada a linha
vermelha? A polícia poderá fazer o que bem entender. E quanto a tudo isso? Não
há vozes?
LANDO: claro que
há vozes pedindo calma, argumentando que não podemos ir tão longe assim. Ocorre
que a situação é muito delicada. É evidente que não se pode querer atropelar
toda a liberdade, todos os direitos e nem é isso o que está acontecendo agora.
Penso também que o governo deve estar ciente e atento a este problema. Mas
neste momento não acredito que esteja ocorrendo algo assim. Aparentemente,
muitas pessoas, isso é muito claro em Paris, estão extremamente amedrontadas e
gostando da forma que a polícia está agindo. Lembre-se: nesta manhã, cinco
policiais ficaram feridos em diligências para prender ou eliminar dois
terroristas que eles acabaram encarcerando na ocasião.
DESVARIEUX: Muito bem.
Então, para você, que está aí na França, em Paris, qual a sua opinião?
LANDO: Minha
opinião é a seguinte: Eu me considero um democrata liberal, democrata com “d”
minúsculo mesmo. Mesmo assim, penso que as medidas tomadas neste momento na
França são realmente necessárias. Como eu disse, você pode comparar com o que
aconteceu nos Estados Unidos no rescaldo de 9/11, quase num piscar de olhos, e
quase sem que o Congresso se manifestasse. Está acontecendo aqui a mesma coisa,
só que eu penso que os franceses estão preocupados com os seus direitos civis,
como os (norte)americanos, mas muito provavelmente de maneira mais intensa.
DESVARIEUX: Muito
bem. Vamos em frente e falar sobre de que maneira temos que agir para chegarmos
a um mundo mais seguro. Quais as políticas que os líderes mundiais devem
perseguir para ter mais segurança em casa? Porque qualquer um pode questionar
que se você está caminhando na direção de um estado policial, da suspensão de
Habeas Corpus e na repressão de liberdades individuais da população, me perdoe,
mas no final você estará caminhando por uma ladeira muito escorregadia. Na
realidade, estamos focados em uma política de intervenção, como na Líbia, onde
proporcionamos o vácuo político que possibilitou o surgimento de organizações
terroristas, quando deveríamos estar focados no fim dessas políticas. O que
você considera como ponto central de uma política de segurança interna?
LANDO: Sim. Não,
penso que minha argumentação tem sido essa desde o início: mesmo antes da
invasão do Iraque, que foi a causa primária de toda essa agitação, a detonadora
da maior parte da turbulência que vemos hoje no Oriente Médio. A decisão da
qual falo foi a primeira invasão, por H. W. Bush em 1990, quando ele avançou em
direção ao Kuwait e mandou 150.000 soldados dos Estados Unidos para o Oriente
Médio. Foi ali que tudo começou. Nenhum árabe quer tropas (norte)americanas
pisando sua terra natal. A seguir, a invasão de George W. Bush na intenção de
derrubar Saddam foi um completo desastre que só aumentou a confusão, destruindo
na essência o tecido social iraquiano e preparando o palco para tudo o que
estamos vendo atualmente.
DESVARIEUX: OK,
tudo bem. Vamos fazer uma pequena pausa e na parte dois falaremos sobre a Síria
e a questão de Assad, se ele fica ou tem que sair, que tem sido a postura
(norte)americana e do ocidente em geral em torno do assunto. Barry, espere um
pouco e venha se juntar a nós para a parte dois. Muito obrigado por estarem
conosco até agora.
Obrigado por se
juntar a nós na Real News Network.
Fim da entrevista.
Traduzido por mberublue
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