domingo, 15 de novembro de 2015

Terrorismo de Estado (francês?)          


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Tony Cartalucci, Strategic Culture          
Tradução pelo Coletivo Vila Vudu            

"Literalmente até 6ª-feira, o generalíssimo Hollande e Fabius, o farsante, só faziam repetir 'Assad must go'. Para o Eliseu, Assad = Daesh"
[15/11/2015, Pepe Escobar, 21h (hor. BSB), pelo Facebook].

         
Notícias falam de ataque terrorista sem precedentes em Paris, com mais de 150 mortos, muitos feridos e todos impressionadíssimos com a escala da violência. (Noticiário BBC, "Paris attacks: Bataclan and other assaults leave many dead" informava que pelo menos cinco locais sofreram ataques simultâneos; outros veículos falaram de bombas e armas leves, inclusive rifles de uso militar). 

Como é possível que o Estado Francês de Vigilância Total nada tenha percebido?

Mais rapidamente e em escala significativamente maior que em ataques terroristas anteriores em Paris contra alvos múltiplos em janeiro desse ano, que terminaram com 12 vítimas fatais, a mídia-empresa ocidental já decidiu que os responsáveis dessa vez são ou o chamado ISIS/ISIL/Daesh/EI, ou gente inspirada pelo "Estado Islâmico".

Em janeiro, imediatamente depois daqueles ataques, a França ampliou muito seu já gigantesco estado de vigilância. O Guardian britânico, em artigo intitulado "France passes new surveillance law in wake of Charlie Hebdo attack" [França aprova nova lei de vigilância, depois dos ataques à redação de Charlie Hebdo] noticiou:

A nova lei permitirá que autoridades espionem as comunicações telefônicas digitais e móveis de qualquer pessoa ligada a qualquer inquérito 'terrorista', sem precisarem de qualquer autorização judicial. A lei obriga todos os provedores de serviços de internet e empresas telefônicas a entregar dados que lhes sejam requeridos.

Serviços de inteligência terão o direito de posicionar câmeras e aparelhos para gravação em residências privadas e instalar os chamados keyloggers que gravam em tempo real qualquer toque no teclado de computador vigiado. As autoridades poderão conservar as gravações por um mês e as informações e dados de atividade de qualquer equipamento eletrônico [orig. metadata[1]], por cinco anos.

Um dos elementos mais discutidos da lei é que ela permite que os serviços de inteligência capturem todas as informações sobre atividade de todos os equipamentos eletrônicos [orig. metadados], que passarão assim a poder ser analisados em busca de comportamento potencialmente suspeito. Todas as informações sobre atividade de todos os equipamentos eletrônicos [orig. metadados] serão anônimos, pra agentes de inteligência podem requer a um painel independente que autorize vigilância mais profunda que pode identificar os usuários.

Apesar de, pelo que se sabia, não ter essas capacidades antes do ataque ao Charlie Hebdo, logo se saberia, depois dos ataques, que as agências de segurança da França, sim, conheciam muito bem, há anos, os atacantes –, mas os suspeitos "sumiram dos radares" apenas seis meses antes do ataque acontecer, o mesmo tempo que qualquer serviço secreto reconhece ser o necessário para planejar e executar ataques daquele tipo.

Slate Magazine noticiaria, em artigo intitulado "The Details of Paris Suspect Cherif Kouachi’s 2008 Terrorism Conviction" [Os detalhes da condenação de Cherif Kouachi por terrorismo em 2008]:

Kouachi foi preso em janeiro de 2005, acusado de planejar para unir-se a jihadistas no Iraque. Segundo a acusação, ele teria sido influenciado por Farid Benyettou, jovem clérigo e "pregador autodidata" que advoga a violência, mas que de fato jamais foi ao Iraque ou cometeu qualquer ato terrorista. Advogados na época disseram que o acusado jamais recebeu treinamento para usar armas, mas "começara a ter ideias perigosas", a ponto de ter manifestado "alívio" por ter sido preso.

CNN, em matéria intitulada "France tells U.S. Paris suspect trained with al Qaeda in Yemen" [França diz aos EUA que o suspeito de Paris treinou com a al-Qaeda no Iêmen]:

Agentes da inteligência ocidentais estão trabalhando para descobrir mais sobre possível viagem dos dois suspeitos de terem praticado os ataques terroristas em Paris, os irmãos Said e Cherif Kouachi, agora que novas informações sugerem que um dos irmãos esteve no Iêmen, associado à Al-Qaeda naquele país – agentes norte-americanos disseram à CNN. Outras informações de fonte próxima dos serviços de segurança franceses põem um dos irmãos também na Síria.

Em artigo intitulado "Overburdened French Dropped Surveillance of Brothers" ["Sobrecarregados, os franceses deixaram de vigiar os irmãos"], o Wall Street Journal revelaria que:

Os EUA forneceram inteligência à França que mostrava que os atiradores no massacre na redação de Charlie Hebdo receberam treinamento no Iêmen em 2011, o que levou as autoridades francesas a monitorar os irmãos, segundo autoridades norte-americanas. Mas a vigilância sobre Said e Chérif Kouachi foi suspensa na primavera passada, disseram autoridades norte-americanas, depois que vários anos de monitoramento nada mostraram de suspeito.

Parece perfeitamente claro que os suspeitos do ataque em Charlie Hebdo podem ter sido terroristas perigosos, rastreados pelo governo por isso mesmo, mas inexplicavelmente 'liberados' para fazerem o que bem entendessem, inclusive ato criminoso de terrorismo em solo francês. – O ato de terrorismo então pode ter sido rapidamente aproveitado para promover junto à opinião pública a aprovação de leis impopulares de vigilância e assim perpetuar o papel da França em inúmeras atividades militares extraterritoriais dos EUA, muito impopular entre os franceses, inclusive na atual guerra por procuração na Síria, em que a França presta serviços a Washington. 

É mais que provável que se venha a descobrir que os envolvidos nos recentes ataques em Paris também foram rastreados pela segurança francesa há muito tempo, antes dos ataques. 

'Descobrir' que os agora acusados 'tinham' ligações com a Síria é indispensável, para justificar a (i) recente aparição do maior navio de guerra francês, o porta-aviões Charles de Gaulle, movido a energia nuclear, no litoral sírio; e a (ii) ampliação da intervenção ocidental, para tentar salvar aquela guerra por procuração que o ocidente está perdendo.


Patrocínio Estatal... Mas de que Estado? Gladio Extra 

Com a crise dos refugiados ampliando-se na Europa, muitas vozes alertaram que a crise estava sendo deliberadamente manipulada para gerar o máximo de histeria, para justificar mais ação militar direta de intervenção na guerra por procuração que o ocidente está perdendo na Síria.

Em artigo anterior que publiquei nessa página, intitulado "Can Pan-European Hysteria Save OTAN’s Syrian War? [A histeria paneuropeia poderá salvar a guerra da OTAN na Síria?], já aparecia escrito:

O que se está configurando é uma estratégia controlada de tensão, pela qual grupos de extrema direita são atiçados contra os migrantes e seus apoiadores europeus, para criar histeria e eventualmente violência que será alavancada pelos que a orquestraram.

Políticas permissivas de imigração e quotas autoimpostas garantiram que uma virtual tsunami de imigrantes se deslocasse pela Europa, ao mesmo tempo em que grupos políticos racistas e xenófobos há longo tempo cultivados – mantidos por redes clandestinas de restos e dissidências do conhecido grupo "Gladio" da OTAN dos anos de Guerra Fria – tentaram fabricar atos de vingancismo e de histeria nas ruas contra uma "invasão" de imigrantes.

A única coisa que ainda faltava para completar a equação era um ato de violência terrível que galvanizasse todas as emoções e justificasse ação militar mais direta da França na Síria – que até agora nem as narrativas de "ajudar os combatentes da liberdade", nem mentiras recicladas sobre "armas de destruição em massa" nem mentiras sobre "bombas-barril" haviam conseguido justificar.

Dentre os alvos nesse ataque mais recente, estava um estádio de futebol onde se realizava um jogo entre as seleções de França e Alemanha, ao qual o presidente francês François Hollande assistia pessoalmente – detalhe particularmente importante, uma vez que saber com antecedência onde estaria o presidente exigiria planejamento e preparação específica. A escolha de um estádio de futebol também é significativa, se se considera que o público tradicional daquele tipo de jogo sempre seria os que mais declaradamente têm protestado contra a expansão do número de refugiados que chegam à Europa. 

Em outras palavras, tudo sugere que o ataque tenha sido planejado especificamente para enlouquecer a opinião pública francesa e empurrá-la para apoiar a agressão militar francesa à Síria. 

[Opinião que se lia hoje no Twitter, 15/1/2015, 19h:

"A coisa não é "Estado", não é "Islâmico" e não tem "capital". Logo, a França atacou a Síria. Pokavergonha (NTs)]

A escala dos ataques é de operação militar. Teve de haver grande grupo de militantes bem treinados, bem armados e bem pagos, com experiência em planejar e executar operações militares coordenadas em ambiente urbano, em movimentar clandestinamente grandes quantidades de armas, experts no manuseio de armas e explosivos, e com capacidades intelectuais suficientes para burlar (seja como for, alguma vigilância teria de ser superada, em qualquer caso) as cada dia mais colossais capacidades de vigilância do estado francês.

Como os terroristas e suas linhas de suprimento que não param de sair de território da OTAN e escorrem para dentro do território sírio, claramente com patrocínios estatais gigantescos por trás deles, os envolvidos nos recentes ataques em Paris também, sem dúvida possível, recebem dinheiro, treinamento e armas, de estados, não de 'grupos privados'.

A França tentará usar os ataques para justificar intervenção militar (ilegal) na Síria para tentar derrubar o governo em Damasco, e, sim, é provável é que os responsáveis pelos ataques em Paris tenham sido aliados da França – Turquia, Jordânia, Arábia Saudita, Qatar – e até o próprio governo de Hollande em Paris – todos esses direta ou indiretamente envolvidos em treinar, armar e financiar os agentes que, essa semana, derramaram sangue francês.

Convenientemente, a principal nave da frota francesa, o porta-aviões Charles de Gaulle movido a energia nuclear, foi enviado semana passada para a costa da Síria. Já está lá há uma semana, posicionado para participar de campanha militar expandida que seria 'oficialmente decidida' 'por causa' dos ataques em Paris... dez dias depois de o porta-aviões ter partido!

A primeira e mais importante questão quando se examina qualquer grande crime é "cui bono?" A quem o crime beneficia? 

Atacar Paris, um estádio de futebol cheio de nacionalistas já cada vez mais violentos e histéricos contra estrangeiros parece beneficiar, exclusivamente, o governo francês, em busca de qualquer vitória, custe o que custar, em guerra que está perdendo longe de casa, enquanto vê sumir qualquer apoio público interno que algum dia tivesse tido. 

Agora, pelo menos por algum tempo, Hollande terá todo o apoio interno de que precisava para atacar Damasco.

Tony Cartalucci

[1] É precisamente o que Edward Snowden ensina, como tradução da palavra "metadata" (ing., Twitter, 2/11/2015):

Are your readers having trouble understanding the term "metadata"? Replace it with "activity records." That's what they are. #clarity


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