Quando os gatos gordos se reúnem em
Munique: bem vindo à Conferência Monetária Internacional.
Sexta feira, 30 de
maio de 2014-06-02
por Andrew
Gavin Marshall
Na parte 01 desta
série, examinei a história e os primórdios da evolução da reunião que tem lugar
entre banqueiros mundiais e autoridades financeiras e monetárias, na
Conferência Monetária Internacional. Na parte 02, o foco foi o papel da CMI no
período que antecedeu a crise financeira mundial de 1980. A parte 03 analisou
qual foi a influência da CMI em toda a crise financeira durante uma década.
Este último item, que está sendo publicado justamente quando a Conferência
Monetária Internacional está sendo preparada para acontecer no período de 01 a
03 de junho, com um encontro no Hotel Bayerischer Hof em Munique, Alemanha – pretende
esmiuçar quais as atitudes da CMI para manter seus status de importância entre
as instituições mais influentes do mundo em termos econômicos, financeiros e
monetários. Está incluso um rol de banqueiros que dirigem a CMI, juntamente com
documentos que vazaram da reunião de 2013, que aconteceu em Xangai.
Em Toronto, 1992, na
Conferência Monetária Internacional que ali teve lugar, havia um consenso entre
os banqueiros privados e autoridades públicas que como o resultado do grande
volume de empréstimos para a América Latina e países em desenvolvimento durante
toda a década que antecipou a crise da dívida em 1980, a missão de financiar “a
conversão da União Soviética em uma economia de mercado” não poderia ser
resolvida apenas com empréstimos bancários. Hilmar Kopper, o CEO (Chief
Executive Officer – Diretor Executivo [NT]) do Deutsche Bank, disse aos
participantes da conferência que os bancos comerciais só se engajariam na
tarefa desse financiamento em larga escala, caso houvesse “créditos garantidos
pelos governos”, além de “um acordo em relação à dívida anterior” o que
implica, na essência, que os bancos necessitariam da garantia de ajuda dos
governos, caso as coisas ficassem ruins. Toyoo Gyohten, Ex ministro das
finanças do Japão disse aos participantes que “o setor público, através de suas
agências, cooperarão com os bancos privados, com a disposição de compartilhar
os riscos inevitáveis.”
Don Mazankowski |
O ministro das
finanças do Canadá, Don Mazankowski, disse aos banqueiros que “nós estamos
preparados para ajudar” o bloco dos países da antiga União Soviética desde que “eles
ajudem a si mesmos e sigam o caminho certo para crescer economicamente e
prosperar.” Em suas palavras estava implícita a fórmula: aplicar austeridade
igual e os pacotes de ajustamento estrutural que foram impostos a outros países
na ocasião da crise da dívida de 1980. Os banqueiros reafirmaram o mesmo ponto
de vista, com a observação de que “seria muito complicado para os governos ser
generosos com a Rússia, a menos que ela estabelecesse um programa para
recuperação econômica que fosse aprovado pelo Fundo Monetário Internacional
(FMI).”
Durante os anos 90, a
CMI continuou a ser um importante fórum de discussões para banqueiros e
autoridades monetárias. Ponderações do Presidente do Federal Reserve Alan Greenspan
e do presidente do Banco Central da Alemanha (Bundesbank) na reunião da
Conferência Monetária Internacional de 1995 tiveram a consequência de levar o
dólar americano a um fortalecimento e ao mesmo tempo, ao enfraquecimento do
marco alemão nos mercados internacionais.
A influência da CMI em anos recentes
No começo do século
21, a Conferência Monetária Internacional permaneceu relevante, como admitiu
Willem F. Duisenberg, presidente do Banco Central Europeu em 2001, em uma
conferência de imprensa. Duisenberg foi duramente criticado pela imprensa européia
por sua recusa em comparecer em um recente encontro entre Ministros de Finanças
e banqueiros de bancos centrais de países da zona do euro que aconteceu em
Bruxelas.
Duisenberg comentou: “gostaria
de notar que tem sido uma tradição desde 1954 que o destaque das reuniões
anuais das CMI, que acontecem a cada ano em local diferente, é um painel dos
bancos centrais, no qual estes, ou seus banqueiros, dos países que têm as três
principais moedas mundiais participam. Eu já participei. Se eu não estivesse
lá, teria chamado mais atenção que se estivesse em Bruxelas ... posso lhes
dizer que a próxima reunião da CMI será ... em Montreal (em 2002), e em
seguida, um ano após, será ... em Berlim. Nas duas ocasiões, podem estar
seguros, se a data da reunião coincidir com o encontro do Eurogrupo, o Banco
Central Europeu será representado no Eurogrupo pelo seu vice presidente.”
Realmente, pudemos
ver que a importância e relevância da reunião anual da CMI, que se realizou em
2013 em Xangai, não diminuíram. Mesmo que a CMI não tenha um site que possa ser
acessado pelo público, consegui montar uma lista (aproximada) de altos
funcionários e membros do Conselho da Conferência Monetária Internacional,
filtrando informações de referências nos currículos e biografias disponíveis ao
público, assim como de documentos vazados, nos quais se inclui uma visão do
programa da conferência de 2013.
Guarde estes nomes
Baudouin Prot |
Baudouin Prot é o
presidente e chairman (presidente do
conselho de diretores ou do quadro de conselheiros de empresa ou corporação [NT]) da Conferência Monetária
Internacional. Antes CEO do BNP Paribas, um dos maiores bancos mundiais com
sede na França, é atualmente presidente desse banco, assim como membro do
conselho de Kering, Veolia Environment, Lafarge, Erbé S/A e Pargesa Holding
S/A. É ainda membro do Painel Internacional de Consultas para a Autoridade
Monetária de Cingapura, do Conselho Consultivo de Líderes de Negócios para o
prefeito de Xangai, da Mesa Redonda de Serviços Financeiros Europeus e é
chairman do Grupo Bancário Europeu.
Frank Keating é o
vice presidente executivo da Conferência Monetária Internacional, presidente e
CEO da Associação Americana de Banqueiros e ex presidente do Conselho Americano
de Seguradores da Vida (2003-2011). Também é ex governador de Oklahoma
(1995-2003) antigo funcionário do Departamento de Habitação e Desenvolvimento
Urbano dos Estados Unidos e ex Secretário Assistente do Tesouro. É ainda membro
do conselho de administração da Fundação Arquivo Nacional, do Centro de
Política Bipartidária, da Fundação Jamestown e já foi membro da Força Tarefa do
Centro de Política Bipartidária para a Redução da Dívida em 2010.
Outros membros do
conselho da Conferência Monetária Internacional já confirmados incluem: Gordon
Nixon, presidente e CEO do Royal Bank of Canada; William Downe, CEO do BMO
Financial Group; Axel Weber, chairman do UBS; Francisco Gonzalez, chairman e
CEO do BBVA; Roberto E. Setúbal, presidente e CEO do Itaú Unibanco S/A; Richard
Waugh, presidente e CEO do Scotiabank; Chanda Kochhar, diretor geral e CEO do
ICICI Bank; Jacko Maree, banqueiro sênior do Standard Chartered; Andreas
Triechl, chairman e CEO do Erste Group Bank; e Walter B. Kielhoz, o chairman da
Swiss Re.
Curiosamente não
existem grandes bancos ou banqueiros americanos arrolados como membros atuais
da diretoria da CMI, que é dominada por banqueiros europeus e canadenses. Há
ainda três banqueiros cujos currículos mencionam que seriam membros da CMI, mas
quando tentei confirmação por contato com a CMI e com a Associação de
Banqueiros Americanos para confirmar a veracidade da afirmação de que seriam
membros do conselho – o conselho da CMI é formado por 15 membros, mas pude
confirmar apenas 12 – nem a ABA nem a CMI responderam às minhas consultas. Os
três banqueiros listados como “membros” – e talvez, mas sem confirmação membros
do conselho da CMI – são Federico Ghizzoni, o CEO do UniCredit; Douglas Flint,
chairman do HSBC (e também chairman do Instituto Financeiro Internacional), e
Ibrahim S. Dabdoub, CEO do National Bank of Kuwait.
Podemos ver então
quais as instituições mais representadas entre os membros do conselho da Conferência
Monetária Internacional, examinando os currículos dos 12 membros do conselho já
confirmados:
Dentre os membros do
conselho da CMI, quatro o são também do Instituto Financeiro Internacional, que
forma o principal grupo de lobby bancário no mundo; quatro membros do conselho
da CMI também são membros do Conselho Internacional de Negócios, do Forum
Econômico Mundial e da Mesa Redonda de Serviços Financeiros Europeus, um grupo
dos grandes banqueiros europeus. Três membros também representam o Grupo
Bancário Europeu, cujo surgimento se deu para assessoramento da União Europeia
na regulamentação do mercado financeiro, assim como do Conselho Canadense de
Diretores Executivos, corporação para agir nos grupos de interesse das grandes
empresas canadenses.
Compartilhando a
liderança com pelo menos dois membros no conselho da CMI, estão o Painel Internacional
de Consultas para a Autoridade Monetária de Cingapura, o Conselho Consultivo de
Líderes de Negócios para o prefeito de Xangai, e o Comitê Consultivo Internacional
do Federal Reserve Bank de New York.
Incluindo-se os três
banqueiros cujos currículos os mencionam como “membros” da CMI, aumenta a
representação na liderança das seguintes instituições: a Mesa Redonda de
Serviços Financeiros Europeus passa de quatro para seis membros no conselho da
CMI, o Grupo Bancário da Comissão Europeia vai de três para cinco membros, o
Instituto Financeiro Internacional de quatro para cinco membros e o Conselho
Consultivo de Líderes de Negócios Internacionais para o prefeito de Xangai
aumenta de dois para três.
Detalhes vazaram em Xangai
O programa planejado
para os quatro dias da conferência em Xangai, realizada no Four Seasons Hotel
Shanghai no começo de junho de 2013 vazaram da reunião da Conferência Monetária
Internacional, naquela ocasião. As boas vindas seriam apresentadas pelo
presidente e CEO da Associação de Banqueiros Americanos, Frank Keating, às
quais se seguiriam o discurso de abertura, proferido pelo presidente do BNP
Paribas e da CMI, Baudouin Prot.
Na segunda feita, 3
de junho, teriam início as palestras da Conferência Monetária Internacional,
que incluíam Han Zheng, membro do Gabinete Político do Comitê Central do PCC
(Partido Comunista Chinês); Mario Draghi, presidente então do Banco Central
Europeu; Douglas Flint, presidente do HSBC e também do Instituto Financeiro
Internacional (e membro não confirmado do Conselho da CMI); Jaime Caruana,
gerente geral do Banco de Compensações Internacionais (BCI); Lord Adair Turner,
ex presidente da FSA (Financial Services Authority) no Reino Unido e membro
sênior do Instituto para um Novo Pensamento Econômico e Janet Yellen, vice
chairman e diretora (atualmente presidente) do Federal Reserve Board.
Outros palestrantes
da Conferência Monetária Internacional incluíam Axel A. Weber, chairman do UBS;
Niall Fergunson, o Professor Lawrence A Tish de História da Universidade de
Harvard; Jacob A. Frenkel, chairman do JPMorgan Chase Internacional e chairman
do Board of Trustees do Group of Thirty (G30); Tharman Shanmugaratnam, vice
Primeiro Ministro e Ministro das Finanças do governo de Singapura; Zhou
Xiaochuan, diretor do Banco do Povo da China (Banco Central Chinês); Jamie
Dimon, chairman e CEO do JPMorgan Chase; Jurgen Fitschen, co-chairman do Deutsche Bank; John G Strumpf, chairman,
presidente e CEO da Wells Fargo; Francisco Gonzalez, chairman e CEO do BBVA;
Sir Martin Sorrel, CEO do WPP e Victor Yuan, chairman e presidente do Horizon
Research Consultancy Group.
Conferencistas
adicionais na reunião foram Jiang Jianqing, chairman do Industrial and
Commercial Bank of China (ICBC); Stephen Bird, CEO para a Asia Pacific e
Citibank em Hong Kong; Michael Pettis, Professor de finanças internacionais na
Guanghua School of Management da Universidade Peking em Pequim; Peter Sands
Diretor Executivo da Standard Chartered; Shang Fulin, chairman do China Banking
Regulatory Commission; Tian Guoli, chairman do Bank of China e Andrew Sheng,
presidente do Fung Global Institute em Hong Kong.
Só o fato de que este
grupo financeiro internacional se encontrou com líderes de bancos e banqueiros
chineses e autoridades do governo chinês Já mostra a relevância da CMI.
Acrescente-se que Janet Yellen, então uma candidata ao cargo de presidente do
conselho do Federal Reserve participou da reunião da Conferência Monetária
Internacional, como vice presidente do Federal Reserve, apresentando na ocasião
sua visão do “que mais pode e deve ser feito” para “tornar o sistema financeiro
mundial mais resistente.”
Yellen |
Entre os assuntos expostos
por Yellen no seu discurso para centenas de banqueiros globais que se reuniram
na CMI de 2013 destaca-se o conceito de bancos “grandes demais para falir” que
a agências reguladoras (e principalmente os bancos centrais) se referem como “sistemicamente
importantes instituições financeiras” ou SIFIs. Yellen observou que houve
propostas para uma “reestruturação radical do sistema bancário” que incluíam a
possibilidade de “ressurreição da separação no estilo Glass Steagall Act (lei bancária promulgada por Francklin D.
Roosevelt que impedia a especulação através de derivativos bancários [NT]) entre os bancos comerciais e os bancos
de investimento, com a imposição de limites ao tamanho dos bancos.” Tranquilizando
os grandes financistas, Yellen disse que “não estou bem certa de que este tipo
de abordagem seria o mais correto a fazer para resolver o problema dos bancos ‘grandes
demais para falir’”.
Realmente, problemas
sistêmicos nos sistemas monetário, financeiro e econômico globais,
provavelmente continuarão por resolver, dado que fóruns como a Conferência
Monetária Internacional têm a permissão de acontecer a salvo do escrutínio do
público. Tais encontros, onde banqueiros centrais, reguladores e homens de
decisão sobre a política financeira se encontram privadamente com os banqueiros
mais influentes do mundo com o fito de obter um consenso, cooperação mais
próxima e finalmente, o conluio entre nossos funcionários públicos e os
banqueiros que lucram com a destruição financeira e econômica que eles mesmos
desencadearam.
Andrew Gavin Marshall
é um pesquisador de 26 anos de idade que mora em Montreal, Canadá. Gerente de
um projeto denominado “Projeto Livro Popular”, é presidente da divisão de
geopolítica do Hampton Institute, diretor de pesquisa do Projeto Global de
Poder do Occupy.com e do World of Resistance (WoR) Report, e apresenta um
programa de podcast (arquivos de áudio transmitidos via internet) semanal através
do BoilingFrogsPost.
Tradução: mberublue
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