Nosso futuro será a ruína
Por Paul Craig Roberts – 16 de janeiro/2015
Os
neoconservadores instalados em seus gabinetes em Washington devem estar em
festa com seu sucesso em usar o episódio Charlie Hebdo para reunir a Europa ao
redor da política externa dos Estados Unidos. Acabaram os votos dos franceses
ao lado dos palestinos contra as posições EUA/Israel. Não mais crescerá a
simpatia dos europeus em relação aos palestinos. Findou-se o crescimento da oposição
europeia ao lançamento de mais e mais guerras no Oriente Médio. Não mais
acontecerão as falas do presidente francês para que sejam suspensas as sanções
contra a Rússia.
Le Pen |
Mas por acaso os
neoconservadores em Washington entenderam Também que amarraram os europeus aos
partidos políticos anti-imigração de extrema direita? A onda de apoio ao
Charlie Hebdo é a mesma onda de apoio da Frente Nacional de Marine Le Pen, do
Partido Independente do Reino Unido de Nigel Farage e do alemão PEGIDA em que
está engolfada a Europa. Foi o fervor anti-imigração pensado e orquestrado para
reunir europeus com Washington e Israel que deu a estes partidos a perspectiva
de poder que hoje ostentam.
Mais uma vez os
insolentes e arrogantes neoconservadores estão errados. O empoderamento dos
partidos Charlie Hebdo de direita e anti-imigração tem o potencial de
revolucionar a política europeia e destruir o império de Washington. Veja minha
entrevista ao King World News com análises sobre o potencial que estes
acontecimentos têm de mudar o jogo. http://kingworldnews.com/paul-craig-roberts-new-crisis-worse-russia-unleashing-black-swans-west/
Os relatos
oriundos do jornal inglês Daily Mail
e do site Zero Hedge de que a Rússia
cortara totalmente as entregas de gás para seis países europeus deve ser
incorreta. Reconhecendo embora a credibilidade destas fontes bem informadas,
não se observa a turbulência política e financeira que aconteceria fatalmente
se o relato fosse verdadeiro. Portanto, a menos que em relação a essa notícia
esteja acontecendo um total blackout noticiário, as ações da Rússia foram mal
interpretadas.
Sabemos que alguma
coisa realmente aconteceu. Em caso contrário, não haveria como explicar a
consternação expressa pelo assessor para a energia da União Europeia, Maros
Sefcovic. Embora eu não tenha ainda uma informação definitiva, creio saber o
que realmente ocorreu. A Rússia, cansada dos ladrões ucranianos, que roubam o
gás que passa através do país em seu percurso até a Europa, tomou a decisão de
dirigir o gás através da Turquia, descartando a Ucrânia.
O Ministro da
Rússia para a Energia confirmou esta decisão acrescentando que caso os países
europeus quiserem ter acesso a este suprimento de gás, deverão construir suas
próprias estruturas ou gasodutos. Em outras palavras, não há corte no presente,
mas há potencial para um corte no futuro.
Os dois eventos –
Charlie Hebdo e a decisão russa de cessar a entrega de gás para a Europa
através da Ucrânia – devem nos lembrar de não descartar eventuais black swans (acontecimentos anormais e que provocam
consequências imprevisíveis – NT) e que black swans podem surgir de
consequências não intencionais de decisões oficiais. Nem sempre o “superpoder”
americano está imune a black swans.
Há tanta evidência
circunstancial de que a CIA e a Inteligência Francesa são responsáveis pelo
tiroteio no Charlie Hebdo como de que os disparos foram perpetrados pelos dois
irmãos, cuja carteira de identidade foi convenientemente esquecida no suposto
carro de fuga. Como a França agiu de forma a ter certeza de que os irmãos
seriam mortos antes de poderem falar, nunca mais saberemos o que eles teriam a
dizer a respeito dos acontecimentos.
A única evidência
existente de que foram realmente os irmãos os culpados pelo atentado tem origem
apenas nas alegações das forças de segurança. Sempre que ouço o governo falar
acusatoriamente sobre evidências reais, lembro-me das “armas de destruição em
massa” de Saddam Hussein, de que Assad “fazia uso de armas químicas” e o Irã
“teria um programa de fabricação de armas nucleares”. Se um assessor da
Segurança Nacional pode vislumbrar no ar rarefeito das alturas “uma nuvem em
forma de cogumelo sobre as cidades americanas”, então Cherif e Said Kouachi
podem muito bem ser transformados em assassinos. Afinal, eles estão mortos
mesmo, não podem reclamar.
Se por acaso (e
nunca saberemos) esta foi uma operação de falsa bandeira, então foi alcançado o
objetivo de Washington de reunir a Europa com o patrocínio intencional de
Washington e Israel. Porém há uma consequência involuntária neste sucesso. A
consequência indesejada está em unir realmente a Europa, mas sob a bandeira da
política de anti-imigração dos partidos de direita, reforçando as posições
adrede adotadas pelos líderes destes partidos.
Caso estas
suposições estejam corretas, então Marie Le Pen e Nigel Farage estarão com suas
vidas e/ou reputações em perigo, pois Washington resistirá a qualquer ascensão
de lideranças que não adotem as linhas impostas por Washington.
A grande
consternação causada pela decisão russa de redirecionar a entrega de gás para a
Europa (através da Turquia, evitando a Ucrânia), é uma prova de que a Rússia
tem muitas cartas que pode ainda jogar e que podem desestabilizar as estruturas
financeiras do ocidente.
A China possui
cartas semelhantes.
Os dois países
ainda não estão jogando estas cartas sobre a mesa, pois pensam que ainda não
precisam. Em vez disso, as duas potências estão se retirando do sistema
financeiro que atende às diretrizes da hegemonia ocidental sobre o mundo. Os
dois países estão criando todas as estruturas econômicas necessárias de que
necessitam para se tornar completamente independentes do ocidente
Portando, perfeito
o raciocínio dos governantes chineses e russos: “Para que aceitar a provocação
e trocar bofetadas com os idiotas ocidentais... eles podem usar as armas
nucleares que possuem e o mundo inteiro estaria perdido. Vamos aceitar as
provocações que nos fazem mas simplesmente nos afastar, já que neste sentido
nos encorajam.”
Sejamos pois
agradecidos ao fato de que Vladimir Putin e os líderes chineses são
inteligentes e humanos, ao contrário dos líderes ocidentais
Imaginem as
terríveis consequências para o ocidente se Putin vir a se tornar pessoalmente
envolvido como resultado das numerosas afrontas que sofrem atualmente tanto a
Rússia como ele próprio. Putin pode destruir a OTAN e o sistema financeiro
ocidental inteiro no momento que quiser. Tudo o que ele precisa é anunciar que,
como a OTAN declarou guerra econômica contra a Rússia, a Rússia não mais
venderá energia para os membros da OTAN.
A consequência
imediata seria a dissolução da OTAN, pois a Europa não pode sobreviver sem os
suprimentos energéticos da Rússia. Seria o fim do império de Washington.
Putin compreende
perfeitamente que os neoconservadores não hesitariam em apertar o botão nuclear
em defesa da vergonha na cara que não têm. Ao contrário de Putin, seus egos
estão na linha de frente. Assim, Putin salva o mundo da destruição simplesmente
não aceitando as provocações.
Agora, imagine se
o governo chinês finalmente perder a paciência com Washington. Para confrontar
o “excepcional, indispensável, único poder” com a sua realidade de impotência,
tudo o que a China precisa fazer é colocar no mercado seus ativos financeiros
massivos, denominados em dólar, tudo de uma vez só, da mesma forma que os
negociadores de metais preciosos do Federal Reserve colocam massivamente no
mercado futuro contratos de ouro a descoberto.
Na intenção de
evitar um colapso financeiro dos Estados Unidos, o Federal Reserve teria que
necessariamente imprimir quantidades massivas de novos dólares com o qual
compraria a avalanche de títulos objetos de dumping despejados no mercado pelos
chineses. O Federal Reserve naturalmente
iria proteger o mercado através da compra das participações chinesas que
estariam sendo objeto de dumping. Nesse caso, os chineses nada perderiam com a
venda. Mas em seguida, vem a jogada fatal. O governo chinês simplesmente lançaria
no mercado a quantidade massiva de dólares que teria recebido pela venda de
seus ativos financeiros denominados em dólar.
O que aconteceria
em seguida? O Federal Reserve pode imprimir dólares com os quais compraria os
ativos financeiros chineses denominados em dólar, mas não pode imprimir moeda
estrangeira para comprar os dólares lançados ao mercado.
Não haveria
compradores para as quantidades massivas de dólares despejados no mercado pelos
chineses. De forma lógica, o dólar rapidamente perderia valor de compra.
Washington não mais poderia pagar suas contas com a singela impressão de
dinheiro. Os americanos, que vivem em um país dependente de importações, graças
aos empregos que foram deslocados para outros países, se veriam em face de
altos preços que afetariam de forma severa seu modo de vida, que seria
corroído. No final, os Estados Unidos se veriam em situação de instabilidade
econômica, social e política.
Deixando de lado
suas lavagens cerebrais, seus apoios defensivos e patrióticos ao regime em
Washington, os norte americanos precisam perguntar a si mesmos: como pode o
governo dos Estados Unidos, autointitulada uma superpotência ser tão
inconsciente de suas próprias vulnerabilidades a ponto de ficar cutucando com
vara curta dois poderes reais até que percam a paciência e joguem suas cartas?
Os norte
americanos precisam entender que a única coisa realmente excepcional sobre os
Estado Unidos é a ignorância da população e a estupidez de seus governantes.
Qual outro país no
mundo deixa pra um bando de vigaristas e crápulas de Wall Street o controle de
sua economia e de sua política externa, o domínio total de seu Banco Central e
de seu tesouro, subordinando o interesse de seus cidadãos aos interesses
gananciosos do bolso de um por cento?
Despreocupadamente,
a população está à mercê de Rússia e China. Totalmente.
Ontem houve um
novo evento tipo black swan, o qual poderia desencadear outros eventos
similares: http://www.zerohedge.com/news/2015-01-16/largest-retail-fx-broker-stock-crashes-90-swiss-contagion-spreads o Banco Central da Suíça anunciou o fim da
indexação do franco suíço ao euro e ao dólar.
Três anos atrás a
fuga de dólares e euros para o franco suíço elevou tanto o valor de troca do
franco que este passou a ameaçar a própria existência da indústria suíça de
exportação. O país então anunciou que qualquer afluxo de moedas estrangeiras
para o franco seria possível apenas com a criação de novos francos que pudesse
absorver os fluxos de moeda estrangeira de maneira que não elevasse ainda mais
a taxa de câmbio futura. Em outras palavras, a Suíça indexou o franco.
Ontem o Banco
Central suíço anunciou que a indexação acabou. O franco no mesmo instante teve
forte alta. Ações de companhias suíças tiveram queda significativa, e fundos de
hedge erradamente posicionados sofreram grande golpe para sua solvência.
Por que a Suíça
desindexou o franco? Não se trata de uma ação sem custos. Para seu Banco
Central e sua indústria de exportação, o custo será substancial.
Encontraremos a
resposta na União Europeia. O Procurador-Geral da UE julga que é permissível
para o Banco Central da União Europeia iniciar uma ação de Quantitative Easing (flexibilização monetária, facilitação monetária,
facilitação quantitativa, etc. No fundo, trata-se de imprimir dinheiro sem
lastro, do nada. Usa-se quando um país está na iminência de deflação, para
estimular alguma inflação. Inunda-se o mercado de dinheiro, através dos bancos,
na esperança de que isso estimule a produção, através do aumento do crédito. O
que acaba acontecendo é a crescente capitalização dos bancos, sem que o
dinheiro chegue ao mercado. Uma quimera. – NT), ou seja, a impressão de
novos euros – na intenção de consertar as burradas de banqueiros privados. Isso
significa que a comunidade financeira da Suíça ficaria na expectativa de uma
fuga maciça do euro e o Banco Central suíço acredita que teria que imprimir
francos em quantidades tão grandes que a base de oferta da moeda suíça
explodiria, superando em muito o PIB suíço.
A política de
imprimir dinheiro sem lastro dos Estados Unidos, Japão e agora presumivelmente
da União Europeia tem forçado outros países a inflar suas próprias moedas na
intenção de prevenir-se contra o aumento do valor de troca de suas moedas, o
que afetaria sua capacidade de exportação para ganhar moedas estrangeiras com
as quais pagar suas importações. Assim, Washington está forçando o mundo a
imprimir dinheiro.
Pois a Suiça
resolveu saltar fora deste sistema. Seguir-se-ão outros? Será que o mundo vai
simplesmente seguir os governos de Rússia e China em seus novos arranjos
monetários, virando as costas para o ocidente corrupto e incorrigível?
O nível de
corrupção e manipulação que caracteriza a economia dos Estados Unidos e sua
política externa atualmente era impossível em outros tempos, quando a ambição e
Washington era pressionar a União Soviética. A ganância pelo poder hegemônico
fez de Washington o governo mais corrupto do planeta.
A consequência da
corrupção é a ruína.
“A liderança é a
passagem para o império. O império gera a insolência. A insolência traz a
ruína.”
O futuro da América
é a ruína.
Paul Craig Roberts (nascido em 03 de abril de 1939) é um economista
norte-americano, colunista do Creators Syndicate. Serviu como secretário-assistente
do Tesouro na administração Reagan e foi destacado como um co-fundador da Reaganomics. Ex-editor
e colunista do Wall Street Journal, Business Week e Scripps
Howard News Service. Testemunhou perante comissões do Congresso em 30 ocasiões
em questões de política econômica. Durante o século XXI, Roberts tem
frequentemente publicado em Counterpunch e no Information
Clearing House, escrevendo extensamente sobre os efeitos das administrações
Bush (e mais tarde Obama) relacionadas com a guerra contra o terror, que ele
diz ter destruído a proteção das liberdades civis dos americanos da
Constituição dos EUA, tais como habeas corpus e o devido
processo legal. Tem tomado posições diferentes de ex-aliados republicanos,
opondo-se à guerra contra as drogas e a guerra contra o terror, e criticando as
políticas e ações de Israel contra os palestinos. Roberts é um graduado do
Instituto de Tecnologia da Geórgia e tem Ph.D. da Universidade de
Virginia, com pós-graduação na Universidade da Califórnia, Berkeley e na
Faculdade de Merton, Oxford University.
Tradução: mberublue
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