domingo, 4 de janeiro de 2015

A premiação “Você está falando sério?” de 2014.
Êpa! São eles novamente!

 Conn Hallinan
por Conn Hallinan

Tradução mberublue



O Prêmio “Caixa de Pandora” deste ano será dividido entre Estados Unidos e Israel, pelo lançamento desastrado da primeira guerra cibernética no mundo, criando um monstro no processo. Em 2010, os dois países criaram secretamente e liberaram o vírus “Stuxnet” para incapacitar o programa de energia nuclear do Irã, travando durante o transcorrer do feito milhares de centrífugas iranianas.

De acordo com o comunicado lançado pela Companhia de Segurança Cylance, “o vírus Stuxnet foi um acontecimento esclarecedor para as autoridades iranianas, mostrando-lhes o mundo da destruição física através de meios eletrônicos. A retaliação contra o Stuxnet começou quase imediatamente.”

Agora, o jornal “The Financial Times” comunica que “Hackers iranianos penetraram dezenas de organizações internacionais entre as quais seis companhias líderes em petróleo e gás natural, seis aeroportos internacionais, sete companhias de aviação, uma importante empresa que presta serviços para a defesa dos Estados Unidos, dez universidades de prestígio e o sistema de computação de vários países do Golfo.”

Apenas um programa dos hackers iranianos, denominado “Cleaver”, de acordo com a Companhia Cylance, “extraiu materiais altamente sensíveis” de governos e companhias chave no Canadá, China, França, Israel, Kuwait, Arábia Saudita, Inglaterra, Alemanha, Índia, México, Paquistão, Coréia do Sul, Turquia e Emirados Árabes Unidos.

O que semeais é o que colhereis.

O Prêmio “Repreensão de Ouro” vai para a Alemanha e sua Chanceler Angela Merkel, por admoestar duramente os gregos, acusando-os de gastos extravagantes, forçando Atenas a engolir medidas extremas de austeridade, enquanto ao mesmo tempo, subornava militares gregos para que gastassem bilhões de dólares comprando armas inúteis.

Conforme o jornal “Kathimerini”, negociantes de armas, principalmente alemães mas também franceses, suecos e russos distribuíram quase 3 bilhões de dólares em propinas, para garantir contratos de armas para a próxima década no valor de cerca de 68 bilhões de dólares. Um desses vendedores de armas “deixou cair” junto ao Ministro do Exército grego, uma mala com mais de 800.000 dólares.

Atenas acabou por gastar 2.3 bilhões de dólares para comprar 170 tanques alemães “Leopard II”, os quais são praticamente inúteis para a luta no terreno da Grécia. De qualquer forma, os tanques foram entregues sem qualquer tipo de munição (embora no mês de agosto passado o Ministro da Defesa da Grécia tenha expelido mais 69.9 milhões de dólares para comprar munição da companhia alemã Rheinmetall).

Os gregos também pagaram mais de 4 bilhões de dólares para adquirir submarinos alemães que estão até hoje em doca seca e, por qualquer medida, são muito barulhentos. Não é lá coisa muito boa ter coisas barulhentas em serviços que exigem silêncio. De acordo com o “Der Spiegel”, a companhia alemã que constrói o U-214 pagou cerca de 2 milhões de dólares para assegurar a assinatura do contrato.

Nesse meio tempo, a política de austeridade  empurrada goela abaixo da Grécia pelos credores internacionais – o FMI, o Banco Central Europeu e a União Europeia – acabaram por empobrecer milhões de gregos e impulsionaram um desemprego da ordem de 20 por cento (50 por cento dos jovens abaixo de 25 anos). Desde 2008, a mortalidade infantil cresceu 21 por cento na Grécia e a mortalidade de crianças cresceu 43 por cento. Os suicídios tiveram um incremento de 45 por cento.

Em troca de seus gastos militares, os gregos atualmente possuem submarinos que não saem da terra, tanques que não podem usar e conferências de Angela Merkel sobre como economizar dinheiro.

O Prêmio “Prioridade Burra” vai para o governo da Índia, por ter gasto 33 milhões de dólares em uma estátua em bronze de cerca de 183 metros de altura, do líder hindu da Independência Vallabhbhai Patel, enquanto, de acordo com a ONU, 213 milhões de hindus são desnutridos, mais que qualquer outro país do planeta e constituindo um de cada quatro pessoas em perigo alimentar no mundo. Quase 48 por cento das crianças estão abaixo do peso recomendado para suas idades, e a Índia, juntamente com a Nigéria são os países responsáveis por uma de cada três mortes de crianças com menos de cinco anos no mundo. A desigualdade econômica é maior na Índia que em qualquer outro país emergente do mundo. Atualmente, a expectativa de vida é maior em Bangladesh e no Paquistão que na Índia.

O jornalista investigativo P. Sainath que cobriu a economia rural da Índia por décadas escreveu que “Um total de 2.960.438 camponeses cometeram suicídio na Índia desde 1995.” Em virtualmente cada caso, motivo do suicídio foi a dívida para com agiotas e proprietários de terras.

Comunicados sugerem aos líderes do governo hindu que elaborem um programa de ajuda aos agricultores, que alimentem os pobres e tirem um momento de calma para ler com vagar o poema “Ozymandias” (apelido grego de Ramsés II- NT) de Percy Shelley (traduzido no final do artigo – NT).

O Prêmio “Tiro no Pé” vai para a administração Obama, por ter parado de comprar os motores para foguetes RD-180 feitos na Rússia, como consequência das sanções impostas a Moscou na esteira da crise da Ucrânia. A substituição do RD-180, um motor barato, confiável e simples que mandou os foguetes norte americanos Atlas III e Atlas V para o espaço desde 1997, custará 1.5 bilhões de dólares e seis anos de prazo para que seja realizada. Um novo motor capaz de lançar tais veículos exigirá que estes sejam redesenhados e atrasará o programa de satélites. No final, o custo total orçará por volta de cinco bilhões de dólares.

Na retaliação ao banimento do RD-180, a Rússia não mais emprestará seus foguetes Soyuz para o abastecimento da estação espacial internacional. Perguntado como os astronautas chegarão até a estação, o representante do Primeiro Ministro russo Dmitry Rogozin sugeriu que eles “usem um trampolim”.

A ESA (European Space Agency – Agência Espacial Europeia) também acabou por tomar uma pancada. Além de perder o serviço de táxi do Soyuz para a Estação Espacial, a ESA perdeu ainda o acesso ao motor RD-180, e terá que acelerar a finalização do problemático foguete Ariane VI, programado para substituir o foguete da Agência, o Ariane V. O “VI” é criticado por ser muito grande, muito inflexível e muito caro – 4.2 bilhões de dólares.

A Rússia anunciou que deslocará seus gastos com a estação espacial internacional, para desenvolver outros projetos espaciais em conjunto com a China.

O Prêmio “O Cachorro Comeu meu Dever de Casa” vai para o Ministério de Relações Exteriores britânico pela “destruição acidental” de documentos que mostrariam que Londres estava profundamente – e ilegalmente – envolvida no programa da CIA norte americana de entrega de presos. O programa removia suspeitos de terrorismo para países onde era permitida a tortura, ou mantinha os suspeitos em “bases negras” secretas onde a CIA realizava sua programação de tortura.

A Inglaterra autorizou cerca de 1600 voos da CIA para dentro e para fora do país e permitiu que os suspeitos fossem levados para a Ilha de San Diego, no Oceano Índico, controlada pela Inglaterra. A cumplicidade com o programa de remoção de suspeitos é um violação da lei britânica sobre sequestro, detenção arbitrária e o direito a um julgamento justo. Também viola a lei internacional contra a tortura.

“Isto está ficando cada vez pior para o governo do Reino Unido em Diego Garcia” disse Cori Crider, da Reprieve, organização de direitos humanos da Inglaterra. “Eles precisam ser muito claros sobre como, quando e onde as evidências foram perdidas.”

O ministro de Relações Exteriores Mark Simmons disse que os registros foram perdidos depois de “danificados pela água”.

O Prêmio “O Rato que Ruge” vai para as Ilhas Marshall por levar os poderes nucleares do mundo – Os Estados Unidos, China, Rússia, França, Inglaterra, Paquistão, Índia, Israel e Coréia do Norte – ante a Corte Internacional de Justiça em Haia pela violação do artigo VI do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares. O artigo VI reza sobre o “fim das armas nucleares em data o mais próxima possível e sobre o desarmamento nuclear”. Índia, Israel e Paquistão não são signatários do tratado – a Coréia do Norte se retirou – mas é muito difícil conversar com os marchalleses sobre o assunto de armas nucleares: em 1954 os Estados Unidos vaporizaram o Atol de Biquiniu com uma bomba de Hidrogênio de 15 megatons e colocaram radiação sobre milhares de ilhéus.

Por um período de 12 anos, os Estados Unidos detonaram 67 bombas nucleares com um poder agregado de 42,2 megatons nas Ilhas Marshalls. A bomba de Hiroshima tinha 15 kilotons. As Ilhas Marshall reclamam no Tribunal que os Estados Unidos são responsáveis por danos da ordem de dois bilhões de dólares, mas até o momento Washington pagou apenas 150 milhões.

Não foram apenas os ilhéus das Ilhas Marshall que foram atingidos. O Centro de Reportagem Investigativa verificou que a marinha dos Estados Unidos desmontava alguns dos navios que tomaram parte nos testes na Ilha do Tesouro na baía de São Francisco. A marinha então teria enterrado o lixo nuclear gerado nos testes no derredor da ilha, criando numerosos pontos de radiação intensa. Na ilha vivem cerca de 2.000 sem teto em habitações subsidiadas pelo governo, que então garantira que nada haveria com que se preocupar, mas ao mesmo tempo deu-lhes instruções para que não deixassem seus filhos cavarem no quintal ou em frente às casas. “Olha aqui, mãe! Essa pedra brilha no escuro!”.

A contaminação nuclear foi constatada também em outras bases na California, incluindo-se a Alameda Naval Air Station, Hunters Point Naval Sgipyard e MacClellan Air Force Base, perto da capital do Estado, Sacramento.

Radiação: este presente dura muito.

O Prêmio “Limão Dourado” mais uma vez fica com a Lockheed Martin por seu avião de bombardeio furtivo de 1.5 trilhões de dólares, o F-35 – a mais cara arma na história do sistema de armamento dos Estados Unidos – que não tem software para trabalhar, não voa na chuva e incendeia quando tenta sair do chão. De qualquer forma, os compradores começam a alimentar sérias dúvidas sobre adquirir ou não o produto. O Canadá testou o F-35 contra o velho F-18 Super Hornet dos EUA, o Eurofighter Typhoon e o Dassault Rafale da França e encontrou entre o F-35 e os demais apenas uma diferença crucial: o F-35 custa entre 116 e 160 milhões de dólares a unidade, enquanto os outros variam entre, respectivamente, 60, 90 e 64 milhões de dólares cada.
Os Estados Unidos foram obrigados a cancelar a estreia do F-35 no prestigioso Farnborough International Air Show, na Inglaterra, porque um dos aviões simplesmente pegou fogo ao tentar decolar da Base Aérea de Englin na Florida. Já restringido a voar em baixas velocidades e com autonomia de apenas três horas de voo contínuo, isso se revelou insuficiente para atravessar o Atlântico.

A Lockheed Martin e Austal USA também marcaram muitos pontos na categoria Limão Dourado com seu Littoral Combat Ships LCS (Navios de Combate no Litoral – NT), os navios USS Freedom e o USS Independence. O programa LCS, de 37 bilhões de dólares previa a construção de uma frota de navios de guerra de calado baixo e alta velocidade, mas que, conforme recentes estudos do Pentágono, não sobreviveriam em combate. O Diretor do Departamento de Testes Operacionais e Avaliação, Michael Gilmore, do Departamento de Defesa, disse que os navios da Lockheed Martins (USS Freedom) e da Austal (USS Independence) “não tem expectativa de sobrevivência em ambiente de combate hostil e não se destinam a uma utilização que os coloque em rota de dano.”

Traduzindo: se entrarem em uma luta, eles serão torrados.

Porém tudo isso pode não ser um problema porque, afinal de contas, o alto custo de manutenção que requerem os navios tipo LCS significa que de qualquer forma os navios não conseguem mesmo chegar a qualquer teatro de batalha. O USS Freedom gastou 58 por cento de seu tempo no Porto de Singapura – mais de duas vezes a média dos navios da Marinha dos Estados Unidos – e o USS Independence ficou durante a maior parte do tempo amarrado em San Diego.

Um adeus para Fred Branfman, que morreu vitimado pela doença de Lou Gehrig aos 72. Branfman ajudou a revelar os segredos da guerra secreta dos Estados Unidos contra o Laos que matou dezenas de milhares de civis e espalhou por aquele país milhões de bombas que não explodiram, armas que continuam a causar morte e sofrimento aos moradores do país até hoje. Os Estados Unidos realizaram 580.000 missões de bombardeio contra o Laos despejando o equivalente a quase uma tonelada de bombas para cada pessoa residente no país. Branfman ajudou a fundar o Centro de Recursos da Indochina onde documentou o que presenciou no Laos enquanto trabalhou naquele país na ajuda humanitária. Posteriormente escreveu o livro “Vozes da Planície de Jars: a Vida Embaixo de uma Guerra Aérea.”

Presente!


Você pode ler os artigos de Conn Hallinan em: dispatchesfromtheedgeblog.wordpress.com e middleempireseries.wordpress.com

Tradução: mberublue


OZYMANDIAS

Percy Shelley

I met a traveller from an antique land
Who said:—Two vast and trunkless legs of stone
Stand in the desert. Near them on the sand,
Half sunk, a shatter'd visage lies, whose frown
And wrinkled lip and sneer of cold command
Tell that its sculptor well those passions read
Which yet survive, stamp'd on these lifeless things,
The hand that mock'd them and the heart that fed.
And on the pedestal these words appear:
"My name is Ozymandias, king of kings:
Look on my works, ye mighty, and despair!"
Nothing beside remains: round the decay
Of that colossal wreck, boundless and bare,
The lone and level sands stretch far away.

OZYMANDIAS (Tradução)

Eu encontrei um viajante de uma terra antiga
Que disse:—Duas gigantescas pernas de pedra sem torso
Erguem-se no deserto. Perto delas na areia,
Meio afundada, jaz um rosto partido, cuja expressão
E lábios franzidos e escárnio de frieza no comando
Dizem que seu escultor bem aquelas paixões leu
Que ainda sobrevivem, estampadas nessas partes sem vida,
A mão que os zombava e o coração que os alimentava.
E no pedestal estas palavras aparecem:
"Meu nome é Ozymandias, rei dos reis:
Contemplem minhas obras, ó poderosos, e desesperai-vos!"
Nada resta: junto à decadência
Das ruínas colossais, ilimitadas e nuas
As areias solitárias e inacabáveis estendem-se à distância.


Origem do texto e da tradução: Wikipedia.

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