A ERA DA POLÍTICA SURREAL
A tragédia de Barak Obama, um presidente
que não aguentou a pressão
por Jeffrey St Clair
Tradução
mberublue
Tenho um fraco por
Harry Reid. Não pela sua política, que continua retrógrada na maioria de suas
proposições, mas pelo homem. Ele é combativo e duro, um verdadeiro lutador de
rua. Tem uma voz que parece um disco de vinil riscado, mas é cruamente honesto.
Raramente fala por enigmas. Quanto adota determinada posição, ele a sustenta
mesmo sob ataque.
Harry Reid |
Em um tempo de
clones políticos, Reid é original, um oriundo da classe trabalhadora ocidental,
cuja mãe, Inez, foi uma lavadeira e o pai, um mineiro, o qual posteriormente
cometeu suicídio durante um longo período de desemprego. Reid cresceu em um
posto avançado de busca, no deserto, em uma cabana de empresa desprovida de
confortos básicos como banheiro ou telefone. Por esforços próprios adentrou a
faculdade de direito, furando seu caminho através do terreno espinhoso da
política do Estado de Nevada a partir do nada.
Resumindo, Reid
personifica todas as qualidades que faltam a Obama. Dessa forma, não foi tão
surpreendente que Reid tenha lançado ao próprio Obama grande parte da culpa
pelo massacre sofrido pelo partido Democrata nas últimas eleições intercaladas
da metade do mandato. Obama parece sofrer uma paralisia psicológica profunda,
que simplesmente o impede de lutar por suas próprias políticas públicas, mesmo
quando o destino de seu próprio partido está na balança. Reid, antigo boxeador,
não tem estômago para pruridos ou timidez em tempos de crise. Ele é direto em
relação a Obama e está certo, pelas razões corretas ou não.
Já Obama, que
ficou visivelmente atordoado com a derrota, de forma inexplicável jogou a culpa
pelos resultados desastrosos em latinos e negros, lamentando o baixo
comparecimento das minorias. Além disso, chamou-os de preguiçosos e ingratos.
Somos tentados a considerar essa esquisita altercação como uma espécie venenosa
de projeção subliminar. A pessoa de Obama carrega consigo uma esdrúxula
qualidade vingativa na qual aqueles que mais deveria amar são justamente os
mais violentamente atacados por ele. As condenações insensíveis do presidente
irritaram aos negros e hispânicos, justamente zangados com Obama. Afinal, a
abstenção também foi igualmente grande entre os progressistas brancos, mulheres
e sindicalistas. Eles também deveriam ter levado sua parte de crédito pela
queda do partido de Obama. Não se deve deixar de levar em conta que foram os
que suportaram os mais violentos golpes durante o mandato de Obama durante
estes últimos seis anos sombrios.
Obama foi
desconcertante mesmo após sua vitória inconteste de costa a costa e seus
movimentos pareciam emanar de um sonâmbulo. Dificilmente encontramos personalidades
políticas que se orgulham de pensar longamente antes de tomar decisões sem
nenhuma inspiração e eivadas de estupidez.
Tome como exemplo
a ação executiva levada a efeito por Obama em relação à imigração, a qual
deveria ter acontecido anos antes.
Trata-se, se tanto, de medida tomada pelas metades, liberando explicitamente
mais de dois milhões de pessoas as quais foram deportadas pelo mesmo Obama. Em
seguida, houve uma resposta insegura e insuficiente à ultrajante decisão do
Grande Júri de não indiciar Darren Wilson por ter atirado e matado Michael
Brown a sangue frio. Não se pode negar que negros e hispânicos estão cobertos
de razão para sentir raiva pelas atitudes indiferentes do presidente Obama em
relação às circunstâncias cruéis que cercam suas vidas.
O abraço mortal
entre os Democratas e o Neoliberalismo continua incontestável desde a ascensão
de Jimmy Carter nos anos 70, o aperto tornando-se mais e mais candente a cada
eleição. Agora, ele domina, mas o partido está moribundo. As atuais vítimas do
neoliberalismo uma vez já constituíram as bases do partido. O Partido Democrata
tornou-se o túmulo de suas antigas facções do New Deal e nem todo o dinheiro
podre dos fundos hedge do mundo inteiro fará com que seus velhos soldados
voltem à vida.
No lugar deles, os
mandatários do DNC (1) congratulam-se com algumas das forças mais maldosas do
cenário político dos Estados Unidos: Os especuladores que manipulam títulos e
capitalistas de apostas de risco, magnatas de empresas DotCom (2), empresários
da indústria armamentista, tubarões do private equity (3) e CEOs antisindicais,
além dos loucos e fanáticos da energia nuclear,
não se esquecendo nunca das tropas de choque do onipresente lobby
israelense, os quais sistematicamente sufocam as vozes que defendem as
aspirações do povo da Palestina. Estamos oficialmente em plena era da política surreal.
Ainda que a espinhosa
palavra “desigualdade” raramente mostre a cara feia nas campanhas presidenciais,
normalmente é regra inviolável das labutas políticas antes das eleições que se
você penetrar fundo na mente do eleitorado, a economia está sempre presente. A recuperação
da economia sob Obama não passa de truque barato, uma ilusão induzida pelo FED
(4). Poucas pessoas estão comprando, e comprando muito pouco no país. A
economia continua desordenada (no
original entropic – entrópica NT), desaquecida, e a
solução permanece no horizonte. A acidez tomou conta do espírito da nação. O
país dissolve-se lentamente, como se estivesse em câmera lenta.
Mas eu continuo
otimista. Penso que estas eleições na realidade foram menos sobre as nuvens
negras da economia e mais sobre o menosprezo. O desprezo das massas em relação
a Obama, aos Democratas, ao maldito, rançoso sistema que promete felicidade e
entrega apenas mais privações e mais guerras. Cedo ou tarde, a fatura dessas
traições contra o eleitorado teria que ser entregue. O preço deve ser pago até
o último centavo.
O novo logotipo do Partido Democrata |
As contradições
flagrantes do Partido Democrata avançaram até um ponto onde teriam que rachar.
Afinal, quem neste mundo defenderia um partido que se recusa a dar assistência
aos seus próprios correligionários em situação de vulnerabilidade? Quem iria
querer participar de um partido político que diligente e impiedosamente esmaga
cada faísca de fervor idealista, desde o Occupy Wall Street aos Defensores do
Sonho, chegando mesmo a ser contra o movimento para os 15 dólares por hora de
trabalho, enquanto persegue de forma maníaca acordos de comércio como o TPP (5),
que não passa de um assassino de empregos nos EUA? Será transformado em
picadinho, mesmo antes de colapsar a partir de seu próprio estado de
decadência.
Barak Obama,
durante a campanha presidencial, vendeu a si mesmo como sendo incomum, um novo
tipo de político, que desafiaria finalmente as forças hegemônicas do roubo
corporativo e do militarismo aventureiro. No fim, mostrou-se apenas mais do
mesmo, sem remorso ou arrependimento.
Esta é a tragédia
de Obama: um presidente que não aguentou a pressão. Que caia, para que de sua
queda cresça uma nova forma de resistência.
Jeffrrey St Clair é editor do site CounterPunch. Seu Novo livro é:
Killing Trayvons: a Anthology of American Violence (Matando Trayvons: uma
antologia sobre a violência americana), com JoAnn Wypijewski e Kevin Alexander
Gray. Pode ser encontrado através do email sitka@comcast.net
(1)
Estabelecido em 1848, o DNC
Democratic National Comittee (Comitê Nacional Democrata) é a principal
organização política a reger os destinos do Partido Democrata nos Estados
Unidos.
(2)
DotCom – empresas (ou domínio) que
fazem a maior parte de seus negócios na internet.
(3)
Ativos consistentes em capital ou
dívidas, fora do sistema público da Bolsa de Valores. Investimento de altíssimo
risco.
(4)
Sistema da Reserva Federal –
Federal Reserve, normalmente grafado simplesmente FED, é uma espécie de Banco
Central dos Estados Unidos. Na realidade é privado e dominado pelos grandes
banqueiros daquele país. Foi criado em 1913.
(5)
Trans-Pacific Partnership – Tratado
multipaíses para regulamentação e regionalização de investimentos, liderado
pelos Estados Unidos, com a participação nas negociações de Austrália, Brunei,
Chile Canadá, Japão, Malásia, México, Nova Zelândia, Peru, Cingapura, Estados
Unidos e Vietnã. Ainda em fase de conversações.
Tradução: mberublue
Nenhum comentário :
Postar um comentário