A OTAN já está em guerra na Ucrânia... e
está perdendo.
por Finian Cunningham
Tradução mberublue.
Em mais um espetáculo
de malabarismo, a mídia ocidental está, nesta semana, apresentando de maneira
distorcida a noção de que os Estados Unidos e a OTAN estariam “considerando
enviar ajuda militar letal” para “defender” o regime de Kiev de uma “agressão russa”.
Não passa de uma
piada sem graça. A explicação real reside no fato de que a OTAN está perdendo a
guerra que trava na Ucrânia e necessita de mais suprimento militar para tentar
recuperar pelo menos um pouco do prejuízo.
Em primeiro lugar, a
imprensa empresa ocidental reconhece maliciosamente que a OTAN, liderada pelos
Estados Unidos supostamente até este momento “só enviou para o teatro de guerra
equipamento militar não letal”. Essa desonestidade retórica tem a intenção de
demonstrar que esse “material não letal” de alguma forma não se trata de
equipamento militar. Ocorre que, letal ou não letal, equipamento militar é
equipamento militar. Então, vamos deixar a semântica de lado. Os Estados Unidos
e seu alter ego de relações públicas conhecido como OTAN, já estão
profundamente envolvidos na guerra da Ucrânia através de forte apoio ao regime
de Kiev, já há mais de dez meses em combates na ofensiva do leste ucraniano que
apenas até este momento, já causou mais de 5.300 mortes.
Em segundo lugar, não
passa de uma ilusão patética a noção de que Washington estaria “reconsiderando”
a possibilidade de enviar para a Ucrânia “ajuda letal” conforme o que foi
relatado na segunda feira pelo jornal New
York Times. Equipamento militar letal já está sendo enviado para a Ucrânia
pelos Estados Unidos e seus aliados da OTAN. Apesar disso, o presidente dos
Estados Unidos, Barak Obama, disse nesta semana que não resolverá o conflito “colocar
mais armas letais na Ucrânia”. Enquanto isso, a chanceler alemã Angela Merkel,
acrescentando que o conflito não pode ser resolvido por meios militares, prometeu
que a Alemanha tampouco fornecerá armas para a Ucrânia. Tanto Obama quanto
Merkel, ou são terrivelmente falsos ou vivem no mundo da Lua. Provavelmente,
ambas as coisas.
Vamos encurtar a
história. Não só agora, mas desde o ano passado a OTAN está em plena guerra na
Ucrânia, se não nas últimas décadas, de forma secreta.
Em sua coluna da SCF
(Strategic Culture Foundation) desta semana, Wayne Madsen fornece provas
precisas e detalhadas de que um avião gigante de transporte, o Antonov AN124,
ucraniano, foi detectado enquanto transportava armas em um vôo através de
vários países da OTAN para Kiev nos últimos quatro meses, pelo menos. O avião
de transporte – o maior do mundo para este tipo de aeronave – foi visto sendo
carregado nos Estados Unidos, Noruega, Itália e Romênia na missão secreta de
canalizar armas pesadas para o regime de Kiev.
Antes disso, o
governo russo já havia afirmado que foram registrados em operação dentro da
Ucrânia, mercenários dos Estados Unidos, provavelmente da empresa Blackwater/Academi,
empresa de segurança contratada pelo Pentágono, lado a lado com unidades do
exército ucraniano, incluindo-se a Guarda Nacional Ucraniana, unidade ao estilo
nazista da SS.
Nesta semana, Alexei
Karyakin, porta voz da auto declarada República Popular de Lugansk disse que
pedaços de munições da OTAN foram recuperadas em várias zonas de combate. “As
marcas da OTAN estavam em vários fragmentos das munições recuperadas... Agora a
OTAN está matando nossos concidadãos”, disse Karyakin.
No início deste mês,
quando a milícia pró russa de auto defesa retomou o Aeroporto Internacional de
Donetsk das forças de Kiev, que o estavam usando como local favorável para
bombardear Donetsk nos meses passados, relataram que entre restos carbonizados
foram encontrados manuais da OTAN em várias línguas europeias, além de outros
itens identificados como equipamento padrão da OTAN.
A Lei de Apoio à Liberdade
da Ucrânia foi aprovada pelo Congresso dos Estados Unidos no final do ano
passado, tornando obrigatória a concessão de ajuda letal e não letal para o
regime de Kiev no valor de 350 milhões de dólares. A administração Obama tenta
manter a fantasia de que teria agido no sentido de prover apenas ajuda “não
letal” na Lei, mas isso é tentar esticar nossa credulidade até os limites do
rompimento.
O entendimento de que
os Estados Unidos e seus aliados da OTAN, Inglaterra, Polônia e Estados
Bálticos inclusive, estão agora – e só agora – especulando sobre a possibilidade
de fornecimento de equipamento letal para o regime de Kiev é simplesmente
risível.
Na realidade, de acordo
com relatórios de fontes confiáveis, as tropas de choque paramilitares do
partido neonazista Setor de Direita foram usadas para incitar os protestos
letais de Maidan em novembro/2013, o que teve como consequência o golpe de
Estado que derrubou o governo do presidente Yanukowich em fevereiro do último
ano, estiveram em treinamento por meses em campos militares na Polônia,
aprendendo técnicas de subversão e terrorismo. A Polônia, um membro da OTAN e a
agência americana CIA instrumentalizaram assim o fornecimento de “cães de
guerra” que precipitaram a crise da mudança do regime e da guerra civil que
hoje se desenrola na Ucrânia.
Podemos voltar ainda
para a “revolução colorida” de 2004, inspirada pela CIA, ou ainda para 1991,
quando a URSS entrou em colapso e os Estados Unidos começaram a infiltração e
fomentação, regada a cinco bilhões de dólares, de “grupos da sociedade civil”
na Ucrânia. A denominação não passa de um eufemismo para a cobertura dos
agentes da desestabilização promovida por Soros-CIA-USAID. Quando, no final de
2013, a estridente Victoria Nuland, neocon do Departamento de Estado se gabou
desajeitadamente durante os protestos de Maidan de ter dispendido cinco bilhões
de dólares em fundos de cortesia, tomamos conhecimento dos fatos. Ainda nesta
semana a comparsa de Nuland no Departamento de Estado, Jan Psaki, mais uma vez
desvendou aos repórteres que os Estados Unidos estão envolvidos em “trabalhos
junto à oposição ucraniana” no anelo de garantir que o país continue seguindo “um
bom caminho” para a “transição”.
O momento em que se
renovam as cismas sobre os presumíveis apoios “letais” é a parte interessante
da história. O jornal The New York Times cita
funcionários de nível superior e antigos funcionários governamentais que
passaram a apoiar o envio dos tais equipamentos militares. Entre eles,
contam-se o Secretário de Estado John Kerry, o presidente do Estado Maior General
Martin Dempsey , o comandante militar da OTAN, general Philip Breedlove, assim
como seu antecessor, o almirante James Stravidis. Algumas outras personalidades
pertencem ao Instituto Brookings e ao Conselho do Atlântico. Esses think tanks
(organizações ou grupos de reflexão e pesquisa que se pretendem independentes,
para a confecção e disseminação de ideias sobre temas variados que podem
incluir desde economia, política, ciência e até mesmo assuntos militares- NT)
recomendaram ao governo dos Estados Unidos, que fornecessem ao regime de Kiev equipamento
militar no valor de 3 bilhões de dólares (U$ 3.000.000.000) para os próximos
três anos. Isso significa dez vezes mais que o concedido pelo Congresso norte americano,
dominado por entusiasmados republicanos.
A Radio Europa Livre,
agência de notícias vinculada à CIA, “esclarece” que o debate sobre o incremento
de ajuda militar ao regime de Kiev foi “intensificado” porque: “o governo
ucraniano (regime de Kiev) sofreu importantes derrotas militares nas últimas
semanas, o que tornou cada vez mais claro que o cessar fogo não funciona”.
Isto é, a junta
militar apoiada pelo ocidente está perdendo a guerra – apesar de já desfrutar
do apoio da OTAN e mesmo tendo supostamente reagrupado suas forças ofensivas
após o cessar fogo.
Além disso, o jornal The New York Times acrescenta outro
fator aos motivos pelos quais Washington agora quer a escalada da agenda
militar, que seja: as sanções econômicas impostas contra a Rússia “não dissuadiram”
o governo do presidente Vladimir Putin. Ou como a porta voz do Departamento de
Estado Jan Psaki afirmou, a Rússia não “mudou seu comportamento”. O significado
é o seguinte: a Rússia se recusou a ficar de joelhos e adotar um comportamento
servil, confrontando as ambições hegemônicas globais de Washington.
Washington e seus
servis vassalos europeus começam a perceber que o seu esquema execrável para a
mudança de regime na Ucrânia corre o risco de dar em nada. Agora, Washington
está tentando salvar seu desastrado gambito para subjugar a Ucrânia e por
extensão a Rússia, através da escalada da aposta militar.
Mas Washington não
pode, sem riscos, aumentar abertamente seu envolvimento militar por razões
políticas adversas tanto nacional quanto internacionalmente. Os Estados Unidos
tem que ser muito cuidadosos para não deixar transparecer que já se encontra
envolvido militarmente até o pescoço na Ucrânia, da mesma forma que seus
parceiros da gang da OTAN.
Assim, Washington
prefere retratar a situação como a “defesa” do regime de Kiev, que dirige um
país que anela se juntar à União Europeia, que ama a democracia e que está
sendo hostilizado pelos insurgentes, os quais por sua vez não passariam de fantoches
travando uma guerra de procuração sob inspiração da Rússia.
As mentiras
sistemáticas que os Estados Unidos e a OTAN tem despejado durante meses sobre o
conflito na Ucrânia se refletem nessa linguagem e raciocínio tortuosos.
A singela verdade é
que a OTAN, liderada pelos Estados Unidos, está descaradamente escalando a
guerra na Ucrânia e dela participando. Pior: está perdendo a guerra desde seu
início. Não é por outra razão que agora Washington tenta realizar todas as
acrobacias retóricas na tentativa de enganar a população ocidental em concordar
com uma enorme escalada militar de “sua” guerra, sob o pretexto de fornecer “armas
letais defensivas”.
Finian Cunningham nasceu em Belfast,
Irlanda do Norte, em 1963. Especialista em política internacional. Autor de
artigos para várias publicações e comentarista de mídia. Recentemente foi
expulso do Bahrain (em 6/2011) por seu jornalismo crítico no qual destacou as
violações dos direitos humanos por parte do regime barahini apoiado pelo
Ocidente. É pós-graduado com mestrado em Química Agrícola e trabalhou como
editor científico da Royal Society of Chemistry, Cambridge,
Inglaterra, antes de seguir carreira no jornalismo. Também é músico e
compositor. Por muitos anos, trabalhou como editor e articulista nos meios de
comunicação tradicionais, incluindo os jornais Irish Times e The
Independent. Atualmente está baseado na África Oriental, onde escreve um
livro sobre o Bahrain e a Primavera Árabe.
Tradução: mberublue
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