A OTAN encontra uma “porta
dos fundos” árabe para fornecer armas a Kiev.
por Finian Cunningham
tradução: mberublue
Cresceram as
suspeitas, que já eram fortes, de que a OTAN, aliança liderada pelos Estados
Unidos, encontrou uma nova forma de fornecer armas sorrateiramente para a
Ucrânia, depois do anúncio, feito nesta semana, de que o regime de Kiev teria
concluído um grande negócio com os Emirados Árabes Unidos para o fornecimento
de armamento militar. Só dizemos “nova forma” porque se acredita que os Estados
Unidos e a OTAN secretamente já fornecem armas para o regime de Kiev, através
de seus aliados Polônia e Lituânia.
O presidente do
regime de Kiev, Petro Poroshenko, festejou a nova parceria estratégica com o
reino do Golfo Pérsico enquanto visitava a International Defence Exhibition (IDEX),
realizada na capital dos Estados Árabes Unidos, Abu Dhabi. Regiamente recebido
pelo príncipe Mohammed Bin Zayed al Nayhan, Poroshenko afirmou ser um
“presidente da paz” mas que a Ucrânia, ou melhor dizendo, o estado falido que
seu regime comanda, precisa de forte
armamento defensivo por causa de seu “inimigo russo”.
Tais
desenvolvimentos surpreendentes encontram a explicação de seu significado real,
quando se descobre que Poroshenko e seu anfitrião árabe, conforme relatado,
realizaram reuniões discretas com funcionários do Pentágono e fabricantes
americanos de armamento militar durante a realização da feira de armamento.
Trata-se de indicação de que na realidade, Washington está coordenando a já
esperada transferência de armas para o regime ucraniano.
Mesmo não tendo
vazado nenhum detalhe da parceria Kiev/EAU, pode-se assumir sem medo de errar
que o fornecimento de armas para a Ucrânia através dos árabes não passa de uma
maneira encontrada pela OTAN e pelos Estados Unidos, apoiadores da junta
colocada no governo pelo ocidente e que tomaram o poder ano passado através de
um golpe de estado, suprirem de armamento o regime de Kiev. Este regime lançou
uma guerra de agressão contra os separatistas do leste ucraniano, infligindo
até agora cerca de 6.000 mortes, principalmente entre a população civil de
etnia russa.
No início do mês
tornou-se claro que Washington e seus aliados da OTAN podem vir a pagar um alto
preço político pelo movimento desastroso que cometeram, ao se envolver cada vez
mais no conflito ucraniano. Quando Washington anunciou que iria em frente com
seu plano congressional de prover o regime de Kiev com “ajuda letal”, houve uma
consternação internacionalmente generalizada contra essas maquinações
imprudentes.
Washington foi
alertada por Moscou que um futuro apoio militar ao regime de Kiev, anti russo e
reacionário, em sua fronteira ocidental, consistiria em uma “escalada
desastrosa”. Então, aparentemente, o presidente dos Estados Unidos, Barak
Obama, recuou de suas propostas de fornecimento de armas e munições letais.
O fornecimento de
armas também foi condenado pelos normalmente servis aliados europeus dos
Estados Unidos. A Alemanha, a França e mesmo a Inglaterra indicaram sua
desaprovação declarando que não seguiriam qualquer movimento no sentido de
enviar mais armas para a Ucrânia. Quem talvez tenha mostrado de forma mais severa
sua desaprovação foi a chanceler alemã, Angela Merkel. Durante visita aos
Estados Unidos, ela reiterou sua posição de “não armar” a Ucrânia para a mídia
estadunidense ao ser recebida por Obama na Casa Branca.
Não restaram
dúvidas de que o público europeu, já cambaleante frente a uma cada vez mais
forte austeridade econômica (leia-se
arrocho – NT via Vila Vudu), desemprego e curtindo forte desdém para com os
políticos europeus irresponsáveis movimentou-se concentradamente, em várias
capitais, em direção à negação total de jogar mais lenha na fogueira do já
furioso incêndio da guerra na Ucrânia. A ideia de antagonizar cada vez mais a
Rússia, seguindo o incendiário militarismo estadunidense na Ucrânia poderia
provocar uma tempestade política na Europa. Então, os normalmente servis líderes
europeus “sim, senhor, sim, senhor!” foram obrigados a desafiar a imprudência
dos EUA.
Aparentemente, o
início de discórdia entre Estados Unidos e União Europeia provocou o nervosismo
de Washington, ante o temor de que o eixo tático de sanções anti russas
acabasse por se desfazer. O presidente Barak Obama e seu secretário de estado
John Kerry se esforçaram para enfatizar que os Estados Unidos e a Europa
estavam “unidos” sobre a crise ucraniana e sua alegada “agressão russa” –
apesar de terem os líderes europeus, publicamente, no mínimo repudiado a
política de armas de Washington.
Então, em vez de
se arriscar a uma divisão nas fileiras da OTAN, Washington e seus aliados
parecem ter encontrado uma engenhosa maneira de contornar o problema – tornar os
Emirados Árabes Unidos a vanguarda para o fornecimento de armas ao regime de
Kiev.
Uma “nova indústria
de defesa” nos Emirados Árabes Unidos tem aparecido em relatos de vários órgãos
da mídia. Acontece que qualquer indústria que tenha lugar em um reino inundado
de petróleo, na verdade é, em grande medida, apenas um meio de acrescentar
valor ou uma plataforma de marketing para as indústrias ocidentais. O setor de
defesa dos Emirados Árabes Unidos é dominado por importações dos Estados Unidos
e pelas grandes indústrias norte americanas do setor, tais como a Boeing, Lockeed
Martin e Raytheon. As operações “em parceria” com os Emirados refletem apenas a
intenção da aristocracia do reino em provocar admiração por estar supostamente
promovendo a diversificação com a criação de setores de alta tecnologia para fugir
da dependência das receitas da exportação de petróleo. Para as grandes empresas
de armamento ocidentais, a venda a retalho nos Emirados promovem apenas uma
cobertura conveniente em termos de relações públicas para as vendas globais de
armamento. Assim, as armas norte americanas e europeias podem ser vendidas para
todas as partes do globo, mesmo aquelas onde esses fornecimentos seriam
considerados antiético – afinal, as vendas teriam sido feitas originalmente pelos
Emirados Árabes Unidos.
Não se esqueça, no
entanto, que, segundo o Stockholm International Peace Research Institute
(SIPRI), os Emirados Árabes Unidos são o quarto maior importador de armas do
mundo. Trata-se de um recorde estarrecedor quando se leva em consideração de
que estamos falando de um país onde a população é de cerca de nove milhões de
pessoas, das quais apenas um milhão são de árabes nacionais, sendo o restante
pessoal expatriado da Ásia e África para trabalhar. Levando em conta apenas uma
base per capita, os Emirados Árabes Unidos são de longe o maior importador de
armas do mundo. Além disso, trata-se de um país que, desde que conseguiu sua
independência formal da Inglaterra em 1971, nunca esteve em guerra.
O SIPRI afirma, em
seu último relatório de tendências globais, que os países árabes do Golfo
Pérsico dobraram suas exportações de armas em anos recentes, mesmo partindo de
uma base já bastante elevada anteriormente. Atualmente, a Aábia Saudita é o
quinto maior exportador de armas do mundo. Catar, Barein e Omã também são
grandes destinatários para as vendas de armas das indústrias armamentistas
ocidentais.
Com 40% das
vendas, o mercado de armas do Golfo Pérsico hoje é dominado pelos Estados
Unidos. Outros grandes exportadores para a região são a Alemanha, França e
Inglaterra. A Rússia também tem uma forte presença no mercado. Mas a parte do
leão é dos aliados da OTAN. Particularmente, a Alemanha tem intensificado suas
exportações de armamentos para o Golfo Pérsico, o que está causando alguns
problemas para o governo Merkel entre a população alemã, que passou a
considerar que o governo alemão está sustentando regimes repressivos e
autocráticos. Blindados em geral e tanques Leopard estão entre as mais
lucrativas exportações da Alemanha.
Os regimes árabes
do Golfo Pérsico se tornaram, dessa forma, arsenais da OTAN. Entre eles, o
arsenal da OTAN por excelência é o pequeno EAU, com seu orçamento de segurança
de 13 bilhões de dólares anuais.
O novo contrato
firmado entre o regime de Kiev e os Emirados Árabes Unidos para o suprimento de
armamento tornou-se assim uma nova frente da OTAN para o fornecimento de armas
para a Ucrânia. Convenientemente para os governos ocidentais, o arranjo tende a
tornar obscura a participação da OTAN aos olhos de seu público, mas apenas
superficialmente.
É um mau sinal para
o instável cessar fogo costurado pelo presidente da Rússia, Vladimir Putin, no
início do mês. Putin tem continuamente alertado para a atitude hostil de
Poroshenko e outros líderes de Kiev, que acusam rotineiramente a Rússia de
agressão, enquanto vomitam bravatas sobre lutar uma “guerra total”. Além de
indulgentes com essa retórica inflamada, Washington e União Europeia têm
renovado as sanções contra Moscou e lançado a culpa do conflito sobre a Rússia.
A junta em Kiev
está claramente usando o empréstimo de 40 bilhões de dólares dos pagadores de
impostos ocidentais cedidos através do FMI para comprar armas para aperfeiçoar
sua máquina de guerra apoiada pela OTAN. O acordo para a venda de armas dos
Emirados Árabes Unidos é apenas uma porta dos fundos para a OTAN introduzir
mais e mais armamento e incrementar o belicismo da Ucrânia contra a Rússia.
(assina) Finian Cunningham -
nasceu em Belfast, Irlanda do Norte, em
1963. Especialista em política internacional. Autor de artigos para várias
publicações e comentarista de mídia. Recentemente foi expulso do Bahrain (em
6/2011) por seu jornalismo crítico no qual destacou as violações dos direitos
humanos por parte do regime barahini apoiado pelo Ocidente. É pós-graduado com
mestrado em Química Agrícola e trabalhou como editor científico da Royal
Society of Chemistry, Cambridge, Inglaterra, antes de seguir carreira no
jornalismo. Também é músico e compositor. Por muitos anos, trabalhou como
editor e articulista nos meios de comunicação tradicionais, incluindo os
jornais Irish Times e The Independent. Atualmente
está baseado na África Oriental, onde escreve um livro sobre o Bahrain e a
Primavera Árabe.
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