Quando nos Estados Unidos… “Não consigo escrever!”
por Andre Vltchek
tradução mberublue
19
de junho de 2015 - Countercurrents.org
Em Los Angeles, no Museu de Arte Contemporânea (Museum of
Contemporary Art – MOCA), uma gigantesca bandeira de cores sangrentas ondulava
em um vento artificial criado por enormes hélices.
Não
havia espectadores para a mostra. Por um instante, pensei que estava sozinho
naquele espaço todo. Mas em seguida percebi dois vultos vestidos com roupas
negras, movendo-se bem devagar na penumbra, grudados aparentemente em desespero
às paredes. Curvados, eles passaram pela livraria, perto de um lugar onde
alguém tinha colocado um pequeno cartaz na parede, onde se lia: “Eu não consigo
respirar!”
Provavelmente
se tratava de uma performance, uma espécie de protesto desesperado de um homem
e uma mulher contra aquela bandeira gigantesca que a tudo devora.
Antes
de morrer assassinado pelo regime, um homem exclamou: “não posso respirar!”
“Eu não posso escrever!”, pensei. Para mim,
isso significa quase o mesmo que não poder respirar.
***
Pela
primeira vez em muitos anos, eu não consegui entregar minha coluna, ou
continuar meus ensaios, por várias semanas.
Mesmo
quando estive preso na República Democrática do Congo, no Kênia, Senegal,
consegui continuar a escrever.
Mesmo
depois que um pastor fascista, um evangélico louco pagou aos funcionários do
hotel para me envenenar na cidade indonésia de Surabaya, eu continuei escrevendo.
Escrevi
em muitas zonas de Guerra e favelas em que grassava o desespero, do Iraque a
Mindanao, do Haiti às Ilhas Marshall.
Mas
eu não consegui escrever nos Estados Unidos da América. Nem uma linha, ou uma
mera palavra. Não agora.
***
Eu
falei. Fui convidado a falar e falei em uma grande conferência no Sul da
Califórnia, e proferi palestras em encontros sobre paz e oposição em Monterey,
San Jose e Fresno.
Fui
convidado a falar sobre o meu livro de 1.000 páginas, já um best-seller, “Expondo
as mentiras do Império”, onde defino de uma vez por todas minha posição
oposicionista em relação ao Império, mostrando os horrores que são cometidos
diuturnamente pelo mundo.
Mostrei
filmes e excertos de meus filmes na África: em Ruanda, Congo, campos de
refugiados somalis e as terríveis favelas de Nairobi.
Fui
convidado a mostrar tudo isso e mais, mas no final, um homem se levantou e
perguntou: “Por que você está nos mostrando tudo isso?”
“Porque o seu país está matando milhões de
pessoas, neste exato momento”, respondi.
Então,
com voz suave, ele perguntou novamente: “e você quer que a gente faça o que?”.
No
momento em que ele se expressou dessa forma, eu acabava de me recuperar de um
monstruoso jetlag, depois de uma viagem de 48 horas vindo da África do Sul, aterrissando
na Califórnia apenas um dia antes da apresentação. Na África do Sul, eu estava
entre meus camaradas, meus amigos. Tudo era diferente: ali havia uma luta
tremenda por um mundo melhor, as pessoas pobres e desvalidas se unindo e
enfrentando o governo, a grande UNISA (Universidade da África do Sul) estava profundamente
envolvida na luta. Lá, falei no 14º Simpósio Internacional de Contribuição para
a Psicologia da Paz. Lá, falei e falei, lutei com vontade, estive envolvido em
negociações, estava ajudando um pleno momento de criação de conceitos: de como
não pode existir paz se não houver justiça, que sem igualdade social a justiça
se torna impossível e que não se pode conseguir atingir o progresso em nenhum
lugar do planeta sem confrontar e lutar contra o fascismo e o imperialismo ocidental.
Na
Califórnia acontecia o contrário. Tudo era totalmente diferente. Na Califórnia,
eu estava só, frente a frente com os rostos frios de multidões hipócritas;
pior: multidões convencidas de sua própria superioridade, mesmo quando
criticavam, de maneira moderada e “benevolente” as ações homicidas de seu país
em incontáveis lugares pelo mundo afora.
“Nada do que nos dizem é verdade”, é a frase
que ouvi de várias pessoas, em muitas ocasiões.
Os
cidadãos do Império aspiram ser descritas como se fossem eles mesmos as “vítimas”.
Será que não acontecia o mesmo na Alemanha Nazista em 1930? Muito provavelmente
sim! “a Alemanha derrotada foi castigada com a hiper inflação, teve que pagar
reparações, por consequência, era a vítima!” Sentia-se vítima dos Bolcheviques,
dos Judeus, dos Franceses, de Roma... Os Estados Unidos, embora não derrotados
externamente, foram derrotados internamente. São duas coisas completamente
diferentes. Mesmo assim, há similaridades, especialmente na maneira com que o
Império trata as “não pessoas”.
Lá
do meio do público, alguém perguntou: “Você acredita em culpa ou
responsabilidade coletiva?”
“Claro que acredito!”, disparei de volta. “Não
se pode negar a responsabilidade e a culpa escancarada do ocidente, da raça
branca, do Cristianismo, do Império! Culpa e responsabilidade coletiva pelas
milhões de mortes cometidas contra as vítimas definidas como ‘não pessoas’.
Vítimas sufocadas com gás, estraçalhadas por bombardeios, mortas à fome,
mutiladas... Culpa e responsabilidade coletiva pelo estupro da livre vontade de
bilhões de pessoas na África, América Latina, Oriente Médio, Ásia e Oceania.
Culpa e responsabilidade coletiva pelo apartheid global em andamento!”
***
Não
pude perceber qualquer senso de urgência no Sul da Califórnia; nem em Fresno,
Monterey ou San Jose. A
vida continua. A vida deles... Sobre outras vidas eles não queriam
nem saber. Eles na realidade fazem mesmo é questão de não saber.
Eventualmente
eles protestam, para que possam se sentir bem.
Fui
empilhando discursos, apresentações e palestras sobre o que eu tinha
presenciado no Oriente Médio: guerras perpétuas, destruição de nações inteiras,
milhões de corpos empilhados uns sobre os outros. Dei exemplos, exibi filmes.
Eu estava oferecendo análises em profundidade sobre a maneira pela qual o
ocidente estava antagonizando a China e a Rússia.
Em
dado momento, comecei a falar, apaixonadamente, sobre as revoluções na América
Latina, sobre poesia e música, sobre as histórias, a beleza quixotesca das
rebeliões. Falei sobre poetas como Neruda, Paz, Cardenal e Parra. Eu tentava inflamar,
incendiar a multidão. Então, de repente, senti que algo estava profundamente
errado... havia um silêncio sepulcral. Olhei para a multidão em frente a mim: a
maior parte da “multidão” consistia de mulheres com idade acima de 80 anos,
algumas em cadeiras de rodas, várias delas dormindo.
“Os jovens daqui são introspectivos…” me disseram.
“Não é fácil fazer com que se interessem...”
Dia
após dia eu me questionava: o que estou fazendo aqui, dentro do país
responsável por milhões de assassinatos em massa mundo afora. Eu mesmo estava
ficando insano cada vez mais, a cada dia, como os vários editores de publicações
da pseudo-esquerda tanto nos Estados Unidos quanto na Europa, que pregam ao
mundo que as pessoas na Espanha, Grécia e nos Estados Unidos na realidade
sofrem muito, quase tanto como os bilhões de “não pessoas” em todo o mundo?
Como se a maioria deles não fosse, apesar de tudo, recebedores de tremendos
privilégios pagos pelo sangue e pela vida de africanos, asiáticos e árabes. Não,
eu ainda sabia quem são as verdadeiras vítimas! Eu ainda sabia o que estava
acontecendo na realidade! Eu precisava dar o fora do país, o mais rápido que
pudesse!
Tudo
era uma tremenda de uma bobagem aqui; “sentir-se bem” era uma coisa ôca!
Movimentos pela paz... movimentos quase sem negros, muito poucos hispânicos ou
asiáticos! Nenhum deles estava comprando nada disso. Eles sabem muito bem que
aquilo não era para eles.
Era
muito claro que as pessoas com as quais eu me encontrava não queriam saber de
mudança alguma. Eles sequer querem obter “conhecimento”. Para quem quer, o
conhecimento está à disposição, na RT, no CounterPunch, em todos os lugares,
realmente, em toda a parte! Mas se obtiver conhecimento, ninguém mais poderá
alegar que não sabia; saber significa a obrigação de agir!
***
Quase
não há revolucionários de esquerda nos Estados Unidos ou na Europa, apenas as
massas moralmente mortas, sem emoção, insinceras, egoístas que morrem de medo
de perder seus privilégios. Os militantes da direita pelo menos são honestos!
O
regime, claro, se aproveita da situação. Ele dá sustentação plena para esse
estado de coisas. Acabaram por se tornar interdependentes, os governos e as
massas, ambos egoístas e hipócritas; estão no mesmo barco. Não é por outra
razão que os partidos fascistas nunca se apeiam do poder: quase todos os
habitantes dos Estados Unidos e da Europa desejam que a exploração e o estupro
do resto do mundo continue como está!
Pode
alguém, qualquer um, acreditar que a massa em protesto na Espanha ou na Grécia está
lutando alguma batalha internacionalista, lutas pela humanidade? Ou eles lutam apenas pela manutenção de seus
privilégios sociais e econômicos? Esses mesmo privilégios nos quais eles
estavam nadando a braçadas há apenas uma ou duas décadas, e que consistiam de
doações ou subsídios, enquanto milhões daqueles que o ocidente considera como “não
pessoas” no mundo pobre estão sendo espoliados e sacrificados, para que os
norte-americanos e europeus vagabundos nos Estados Unidos e na Europa possa
viver com qualidade de vida, só porque nasceram brancos e “no lugar certo”?
A
esquerda se perdeu tanto nos Estados Unidos quanto na Europa. Clara e
vergonhosamente, se perdeu. Mas mesmo agora, ainda é tão arrogante que tenta
arrostar países como a China ou Rússia com o seu ar cristão e ocidental de
superioridade; tem o atrevimento de tentar permanecer no direito de decidir se
a China ou a África do Sul são de fato socialistas ou comunistas, ou, para usar
um mote da propaganda enganosa que grassa no ocidente, “ainda mais capitalistas
que o ocidente”.
Durante
as duas semanas que fiquei na Califórnia, não detectei qualquer sinal de
remorso. Quando mostrei e expliquei como milhões de pessoas foram mortas pelo
imperialismo ocidental, as pessoas diziam, compungidas: “nossa, que coisa
horrível!” Só o faziam porque foram treinadas para reagir dessa forma. Mas não
havia qualquer determinação para mudar essas coisas nem qualquer sentimento
real.
Para
onde quer que eu fosse, me sentia fora do lugar. Esperava-se que eu “me
adequasse”. Foi-me dito que não mostrasse tantas imagens chocantes, porque as
pessoas eram “muito sensitivas”! Eventualmente, decidi não mostrar mais nada,
nem imagens nem filmes. Estabeleceu-se que eu deveria ser educado. Enquanto
isso, tudo o que eu queria era gritar insultos na face daquelas pessoas cheias
de direitos, homens e mulheres, que nada mais faziam que seguir uma odiosa
tradição cristã: ignorar o mal real, fazer alguma coisinha de bom, tudo para
que pudessem ter algum crédito para enfrentar uma suposta eternidade.
Enquanto
isso continuei a ouvir os mesmos velhos clichês sobre a paz e a democracia.
Alguns esperavam a justiça e o fim das guerras, mas agarrando-se
desesperadamente aos símbolos do Império, ao legado de seus colaboradores, como
Vaclav Havel, o Papa João Paulo II, o Dalai Lama e Madre Teresa...
Eu
não só não podia respirar, mas tinha perdido também a capacidade de escrever. A
raiva crescia como um edifício dentro de mim. A raiva era sufocante, me
estrangulava. Era uma raiva insalubre, improdutiva, misturada com frustração!
Não era como a raiva sagrada que sente aquela pessoa que parte para uma luta contra
o mal. A raiva se estabelecia de uma forma também mesquinha, indescritível e
patética. Ela me sufocava e humilhava ao extremo.
Terminei
odiando a luta que enfrentava ali.
***
Tentei
olhar para a realidade que me cercava com olhos diferentes, mas para onde quer
que olhasse, via apenas uma cultura e um país em colapso, triste e disfuncional.
Dirigi
por estradas esburacadas, cheia de solavancos, embarquei em um sistema ferroviário
primitivo. Encontrei as pessoas, as quais não estavam absolutamente
interessadas em trabalhar ou em melhorar o país. Fui confrontado com o
individualismo, com o egoísmo. Vi pessoas que claramente se odiavam
profundamente, mas pretendiam ser cheias de cortesia e preocupação uns com os
outros.
Mas
bastava que se fizesse um movimento errado. A explosão viria a seguir.
Vi
um país onde não mais existiam os valores positivos e sentimentos humanos mais
básicos.
***
Estar
inserido neste tipo de sociedade é extremamente humilhante. Tentei mandar uma
caixa pelo correio. No posto dos Correios de Clermont, fui obrigado a refazer a
embalagem por três vezes, porque nas duas vezes anteriores, a caixa não era a
correta (só o chefe do posto dos Correios de Clermont sabia qual era a caixa
correta, mas ele jamais se daria ao trabalho de me explicar). Na estação
ferroviária, uma mulher que estava parada, apenas batucando em seu Smartfone me
explicou que os bilhetes para a viagem de trem não são vendidos na estação. Tive
que sair para o sol inclemente, tentando comprar de uma máquina automática de
vendas de bilhetes. O sol não me deixou ver nada e voltei para dentro da
estação e pedi novamente. “Se quiser, você pode ligar para a Companhia e
reclamar”, me disseram. “Nesse caso, posso comprar o bilhete a bordo do trem?” “Não!”
“E tem mais: se você embarcar no trem sem o bilhete, você pode ser preso”.
Tudo
começou já na minha chegada. Depois de viajar durante 48 horas desde a África
do Sul para o sul da Califórnia, carregado com filmes e livros para a conferência,
não havia ninguém me esperando no aeroporto. Então, tive que tomar um táxi.
Acontece que no lugar onde eu deveria supostamente ficar, também não havia ninguém
esperando. Tive que ficar na rua esperando por mais de uma hora. Dias depois, tendo
viajado para outro lugar, a pessoa que deveria estar me esperando para me pegar
só chegou duas horas depois. Quando comentei o fato em voz normal, ele começou
a gritar: “quem sabe você quer ir a pé?”.
Não
que eu esperasse qualquer coisa de bom dos habitantes de um país que esta neste
mesmo instante assassinando milhões de pessoas, mas a arrogância que encontrei
foi uma coisa alucinante. Pior: não se trata apenas da arrogância já conhecida
do pessoal da segurança nos aeroportos. Estou falando da arrogância que vem de
cidadãos comuns dos Estados Unidos.
Foi
fácil detector também uma inacreditável perda de disciplina. Na China ou no
Vietnã, assim como na Índia, as pessoas seriam demitidas apenas por usar o tom
de voz e as posturas adotadas pelos empregados norte-americanos. Ouvi muitas
vezes coisas como “não queremos acabar tratados como os trabalhadores asiáticos”.
“Ótimo!” respondi eu. “Muito
bem! Mas não espere que os trabalhadores pelo mundo afora que trabalham muitas
horas extras se guiem pela sua moleza”. Tal atitude, que beleza, um luxo!
Ao
partir dos Estados Unidos para o Equador, tentei fazer o chek-in da bagagem
para meu destino final. A funcionária da companhia Delta sequer fazia ideia de
onde fica Quito, e era visível que às 05h20min ela não fazia questão nenhuma de
aprender. Assim ela fez a checagem da bagagem apenas até o México, e quando eu
protestei (afinal de contas, eu teria que fazer outra checagem da bagagem na
alfândega mexicana, arrastando as malas para lá e para cá) ela começou a
vomitar um monte de normas, inventadas na hora. Insisti. Ela chamou o supervisor. Este
determinou que ela fizesse a checagem até meu destino final, Quito. Ocorre que
ela não tinha a menor ideia de como fazer isso. Tornou-se apologética? Nem pensar. Quanto
mais tempo demorou, mais implicante e teimosa ela se ficou.
Obviamente, a única coisa que o Império aprendeu foi como matar “não pessoas” a longa distância, e como ficar no
controle remotamente.
Os
cidadãos do Império dos Estados Unidos passam o tempo a reclamar que seus
privilégios estão desaparecendo. Bem, na realidade eles estão evanescendo, mas
grande parte deles ainda está lá. Fora dos Estados Unidos, nenhum país poderia
sobreviver com trabalhadores tão sem ética e de tão baixa performance.
No
ocidente, “ser de esquerda” significa sacrificar ainda mais os trabalhadores já
brutalmente explorados lá fora, para manter os privilégios absurdos dos
ocidentais.
Para
nós, em vez disso, a esquerda significa “internacionalismo”.
Essas
duas visões não só não se complementam, como são antagônicas. As metas da
esquerda no Equador ou na Venezuela sofreriam grande prejuízo, se as esquerdas
dos Estados Unidos e Europa tivessem sucesso.
O colonialismo
nunca morre!
O
apartheid nunca foi desmantelado. Apenas se tornou global.
A
escravidão continua, embora com outros nomes.
Se
assim não fosse, como poderiam os Estados Unidos sobreviver na sua forma hoje
em dia?
***
Nestas
duas semanas em que estive nos EUA, conheci alguns dos maiores pensadores que
aqui vivem: Michael Parenti e John Cobb. Tempos atrás, eu trabalhava juntamente
com Michael em dois livros, um dele e outro meu, mas era a primeira vez em que
o via face a face. Discuti o cristianismo com John Cobb, tentando definir onde
se encontra escondida a codificação que permite as mais horríveis atrocidades
que são cometidas em nome da cruz. Foi uma discussão filosófica profunda que
deveremos converter brevemente em um novo livro.
Tive
ainda o prazer de passar uma tarde prazerosa em Los Angeles, com o editor do
CounterPunch. Joshua Frank e sua companheira Chelsea, pessoas de bom coração e
que saber ser divertidos para os convidados.
Viajei
e trabalhei em conjunto com Dan Yaseen, um ativista dedicado do rádio, e sua
parceira Camille.
Sim,
é claro que existem pessoas brilhantes, boas e devotadas vivendo nos Estados
Unidos. Mas mesmo eles sabem e admitem que seu grupo é muito pequeno frente o
tamanho do país, e também pequeno para fazer parar os crimes que o Império
continua a cometer.
***
Deixei
o país muitos anos atrás. Saí de Nova Yorque, que foi a minha casa por mais de
uma década. Nunca retornei, a não ser para o lançamento de maus livros e
filmes, e para ver alguns amigos. Nunca fiquei por longo tempo. Desta vez, por
duas semanas, foi a mais longa estadia por anos.
Esta
visita me quebrou. Fiquei fortemente deprimido e exausto.
Pude
ver claramente como uma grotesca pseudo-moralidade, conceitos religiosos
repugnantes e a hipocrisia que influenciou e arruinou estados clientes e nações
inteiras, no mundo inteiro, especialmente na Ásia e África.
Sim,
acredito em culpa coletiva. Como tenha a cidadania norte-americana, carrego
esta culpa. Portanto, trabalho sem parar, não para deixar minha consciência
limpa, mas para tentar estancar a loucura.
Estou
convencido de que o ocidente, a raça branca e seus lacaios no estrangeiro, não
tem o direito de governar este planeta. Vi o suficiente para cristalizar minha convicção.
O
ocidente acabou e sua cultura está morta. O que ainda resta, além de não
atrair, é realmente horrível. Não há coração, não existe compaixão nem
criatividade. Aqueles bilhões de pessoas fora do território ocidental não
deveriam estar morrendo enquanto são forçados a apoiar o individualismo
agressivo pós cristão, pós cruzadas colonialistas além do fascismo dos Estados
Unidos e da Europa.
***
Durante
aquelas duas semanas horríveis, a minha habilidade de escrever entrou em
colapso, mas apenas até o momento em que o trem de pouso do avião em que eu me
encontrava viajando para o sul, em direção à América Latina perdeu o contato
com a pista de decolagem do aeroporto de Salt Lake City.
Em
seguida, tudo voltou ao normal. Os motores rugiam e eu abri meu Mac e comecei a
teclar. Até o momento de desembarcar na Cidade do México, fui capaz de escrever
a metade deste ensaio. Em Quito, cercado pelo calor e pela bondade das pessoas
locais, na maioria indígenas, me senti mais uma vez forte e feliz. Comecei
então a escrever; mais uma vez, eu era capaz de escrever. Sobrevivi. O pesadelo
tinha chegado ao fim.
Andre Vltchek É um filósofo, cineaste e
jornalista investigativo. Cobriu guerras e conflitos em dúzias de países. Seus últimos livros são: “Mostrando
as mentiras do Império” e “A luta contra o imperialismo ocidental”. Diálogo com
Noam Chomsky: “Sobre o terrorismo ocidental.” Pode ser encontrado através de
seu site http://andrevltchek.com ou de seu twitter https://twitter.com/andrevltchek
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